Folha de S. Paulo


Deputado quer acabar com transmissões de julgamentos do STF e de tribunais superiores

A disputa entre o Legislativo e o Judiciário pode ganhar novos elementos no próximo ano. Um projeto de lei protocolado na Câmara pelo deputado petista Vicente Cândido (SP) quer acabar com as transmissões ao vivo dos julgamentos do Supremo Tribunal Federal e de tribunais superiores.

Sem citar o caso do mensalão, o deputado afirma na justificativa da proposta que, por muitas vezes, as entranhas da Justiça vêm sendo mostradas com "sensacionalismo exacerbado por parte de alguns ministros em particular". "Basta isso para que tenhamos uma espécie de desmoralização da nossa Corte Suprema", diz.

Durante o julgamento do caso, os ministros divergiram e em vários momentos chegaram a insultar uns aos outros. Em agosto, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, acusou o ministro revisor do mensalão, Ricardo Lewandowski, de fazer "chicana", ou seja, de atrasar a conclusão do caso. O episódio constrangeu os demais ministros e repercutiu nas redes sociais.

Para o ministro Marco Aurélio Mello, que sancionou a lei que deu origem à TV Justiça em 2002, a proposta é um grave retrocesso na questão da transparência institucional. Para ele, o autor do projeto deveria estar "preocupado em tornar o local onde ele trabalha mais transparente ao invés de querer intervir em outro poder". Procurado, o presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, disse por meio de sua assessoria que não iria comentar o projeto.

ENCOMENDA

Vicente Cândido nega, no entanto, que a proposta tenha sido feita por causa do mensalão e garante que ela não foi discutida com dirigentes do PT. Mas o deputado admite considerar que o mensalão ressaltou a vaidade de alguns magistrados e avalia que eles acabaram adotando um comportamento diferente diante das câmeras. "Juiz não tem que dar show, não tem que achar que está em um programa de palco", disse. O deputado afirmou ainda que não é papel do Judiciário dar satisfação para a opinião pública mas apenas divulgar as decisões. "As transmissões são parte de uma experiência que não deu certo. Diante das câmeras qualquer pessoa muda seu jeito de ser e isso acaba distorcendo os julgamentos", disse.

Para viabilizar a proibição, o projeto altera a lei sobre serviço de TV a Cabo. A legislação atual determina que as operadoras são obrigadas a reservar um canal para o STF para "divulgação dos atos do Poder Judiciário e dos serviços essenciais à Justiça". A proposta que será analisada pelo Legislativo, inclui na lei a vedação das transmissões ao vivo. Os programas também não poderão exibir trechos editados das sessões tanto do STF quanto dos tribunais superiores.

No entanto, o projeto não trata de possíveis punições para a TV Justiça, que é a geradora do conteúdo, e não faz menção às transmissões pela internet, que em tese, poderiam continuar. Questionado, o deputado afirmou não ter pensado nestes aspectos e admitiu que o texto terá que ser mudado assim que começar a tramitar na Câmara.

O texto ainda não foi distribuído para as comissões. Alguns líderes avaliam, no entanto, que, por ser polêmico e ingerir em outro poder é possível que ele seja abandonado e acabe arquivado.

EXTINÇÃO

Desde a criação da TV Justiça, as transmissões ao vivo dividem a opinião de ministros e advogados. O ex-presidente da Corte e ministro aposentado Cesar Peluso defende o fim das transmissões porque considera que uma pessoa altera seu modo de ser e agir diante das câmeras. Por diversas vezes, o ministro afirmou publicamente que considera perigoso que as cortes possam estar se alinhando à opinião pública. O ministro Teori Zavascki, que não participou da primeira fase de julgamento do mensalão, declarou quando tomou posse na Corte também ser contra as transmissões.

Editoria de Arte/Folhapress
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