Folha de S. Paulo


Ex-delegado nega tortura em depoimento à Comissão da Verdade

Apontado por diversas testemunhas como torturador de presos políticos durante a ditadura militar (1964-85), o delegado aposentado da Polícia Civil Aparecido Laertes Calandra prestou depoimento nesta quinta-feira (12) à Comissão Nacional da Verdade e negou todas as acusações.

Conhecido no período militar pelo codinome de capitão Ubirajara, que ele renega, Calandra atuou por quase uma década no Doi-Codi (Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna) do Exército em São Paulo, centro onde militantes de esquerda foram presos e torturados pela repressão política.

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Antes de responder às perguntas da comissão, ex-presos políticos que estiveram detidos na unidade relataram torturas e a participação de Aparecido Laertes Calandra nessas sessões. "Tive ao menos em três momentos com o capitão Ubirajara", relembrou Maria Amélia Teles, detida no Doi-Codi em dezembro de 1972. "Fui torturada e interrogada por ele. Levei choques elétricos, sofri afogamento e espancamentos e passei pelo pau de arara", disse.

Quatro outros ex-presos políticos apresentaram seus testemunhos e também afirmaram que foram torturados pelo policial ou que ao menos testemunharam ele torturando detidos.

Acompanhado pelo advogado Paulo Esteves, Calandra não assistiu a todos os depoimentos --chegou no auditório no final do penúltimo--, mas a comissão o indagou sobre as acusações. "Nunca violei os direitos humanos, nunca torturei", disse.

Segundo Calandra, sua função no Doi-Codi era fazer assessoramento jurídico. Ele alega não ter realizado interrogatórios ou participado de operações para prender subversivos. Confrontado com um ofício do Exército que o cita como membro do "serviço de informações", ele alegou tratar-se de uma mera formalidade.

Em sua atuação no órgão do Exército, Calandra disse que nunca "ouviu referência à tortura", e evitou comentar nomes de pessoas com quem trabalhou -- a exceção foi uma rápida e respeitosa referência ao coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, que chefiou o Doi-Codi DOI-Codi do Exército em São Paulo.

Mostrando frieza em seu depoimento, o ex-delegado deixou o auditório do prédio da Presidência da República em São Paulo, onde ocorreu a sessão, afirmando "dormir muito bem". Em resposta, ouviu dos poucos ex-presos políticos que acompanhavam a sessão gritos de "assassino mentiroso" e "torturador".


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