Folha de S. Paulo


Análise: Barreiras para criação de partidos não garantem representatividade

A aprovação do Solidariedade e do Pros e a rejeição da Rede Sustentabilidade pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) acendeu o debate sobre as regras para criação de partidos no país.

Desde 1945, quando foram estabelecidos critérios para a organização dos partidos no Brasil, exige-se de tais organizações um "caráter nacional".

A legislação atual determina que isso se materialize no "apoiamento de eleitores correspondente a, pelo menos, meio por cento dos votos dados na última eleição para a Câmara dos Deputados, não computados os votos em branco e os nulos, distribuídos por um terço, ou mais, dos Estados, com um mínimo de um décimo por cento do eleitorado que haja votado em cada um deles" (Lei 9.096/95, Art. 7).

A barreira é muito alta? Certamente não é algo que se consiga da noite para o dia. Além de tempo, lembrando que as assinaturas devem ser validadas por certidões emitidas pelos Cartórios Eleitorais, os fundadores deverão ter capacidade de articulação e mobilização ou, na ausência tais fatores, recursos para a contratação de apoio profissional. Mas não se trata de algo intransponível. Caso contrário, teríamos menos siglas registradas no TSE.

Por outro lado, o apoiamento garante representatividade aos partidos? Dificilmente. Creio que ninguém duvidaria que as ideias da ex-senadora Marina Silva possuem muito maior penetração nacional do que as genéricas propostas encontradas no site do Pros.

Do mesmo modo, pouquíssimos brasileiros notariam alguma diferença se este último não disputasse as eleições de 2014, mas o mesmo não se pode dizer a respeito da Rede. O patamar de meio por cento é apenas um limite legal; tão vazio de conteúdo quanto outro qualquer.

Mas o atual episódio permite que o debate vá um pouco além: mais importante do que estabelecer barreiras à criação de partidos é definir critérios mais rigorosos para que estes tenham acessos a recursos de origem pública.

No atual contexto, e ainda que isso não se aplique à Rede, criar partidos é um excelente negócio. Sem que seja necessário eleger um único vereador, o eventual proprietário de uma legenda tem acesso a recursos do Fundo Partidário e a tempo no horário gratuito do programa eleitoral.

Mais ainda, o volume de recursos aumentará de forma expressiva se o novo partido atrair adeptos na Câmara dos Deputados, como ocorreu com o PSD e se repete agora, com o festival de adesões já noticiadas ao Solidariedade e ao PROS.

Carlos Ranulfo Melo é professor Titular do Departamento de Ciência Política da UFMG.


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