Folha de S. Paulo


Promotores e ex-executivos da Siemens negociam acordo para tentar evitar punições

Os seis executivos que ajudaram a multinacional alemã Siemens a expor o cartel de empresas que atuou em licitações públicas de trens em São Paulo e Brasília estão negociando um acordo com o Ministério Público de São Paulo para colaborar com as investigações e tentar evitar punições na área criminal.

Promotores envolvidos com as investigações desconfiam que funcionários públicos receberam propina das empresas para facilitar a atuação do cartel e acham que os executivos podem contar o que sabem sobre isso se tiverem a promessa de que não sofrerão punição depois.

A legislação brasileira permite a negociação de acordos de delação premiada para incentivar criminosos a colaborar com investigações em troca de redução ou extinção de penas. Os acordos entre promotores e investigados precisam receber o aval da Justiça.

Ao se juntar à Siemens na denúncia do cartel dos trens, os seis executivos ganharam imunidade do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), órgão do Ministério da Justiça que investiga abusos do poder econômico.

Isso significa que eles não poderão ser processados pelo crime de cartel ou por fraude em licitações, mas continuam ameaçados de punição se for comprovado que havia corrupção e outros crimes no esquema. Um acordo de delação premiada poderia ajudar a eliminar essa ameaça.

Até agora, o Ministério Público ouviu quatro dos seis executivos, e todos os depoimentos foram decepcionantes, na avaliação de promotores ouvidos pela Folha. Eles simplesmente repetiram o que já haviam dito ao Cade.

Dos seis executivos, apenas um continua trabalhando na Siemens. Os outros já estavam fora da empresa havia alguns anos quando a Siemens procurou o Cade para denunciar o cartel dos trens.

Em suas discussões com o Cade, a Siemens afirmou não ter evidências de pagamento de propina a funcionários públicos, mas os promotores veem isso com ceticismo. A avaliação no Ministério Público é que não existe a prática de cartel sem propina.

Um dos executivos que assinou ao lado da Siemens o acordo com o Cade neste ano é o autor de uma carta enviada à sede da empresa na Alemanha anonimamente em 2008 com denúncias de corrupção. Na carta, o executivo diz que funcionários do governo estadual recebiam comissão de 7,5% do valor dos contratos para ajudar o cartel.

Esse executivo é o principal alvo do acordo de delação premiada proposto pelo Ministério Público. Na carta, ele afirma que, "apesar de todos os escândalos e consequências para a companhia, a Siemens Brasil continua pagando propinas no Brasil para conseguir contratos lucrativos".

Em 2008, a Siemens foi multada em US$ 1,6 bilhão por autoridades nos Estados Unidos e na Alemanha por corrupção de agentes públicos e prática de cartel em outros países. A empresa tem evitado manifestações públicas sobre o cartel, por causa do sigilo imposto pelo Cade às investigações em curso.

A principal dificuldade para o acordo de delação premiada é o endosso da Justiça. Como o Brasil tem pouquíssima experiência nessa área, os juízes são relutantes em homologar acordos antes da fim do processo judicial.

Editoria de Arte/Folhapress

Endereço da página: