Folha de S. Paulo


Análise: Há situações em que voto secreto está a serviço da democracia

Pressionado pela opinião pública após a desastrosa manutenção do mandato do deputado Natan Donadon, a Câmara aprovou uma PEC que determina o fim do voto secreto no Parlamento em todos os casos previstos pela Constituição Federal.

O alcance do voto secreto não se limita a cassações de mandato parlamentar. O expediente vale para eleição de presidentes dos Legislativos, julgamento das contas do presidente da República, autorização de estado de sítio, indicações de autoridades e chefes de missões diplomáticas, exoneração "de ofício" do procurador-geral da República e ainda apreciação de vetos presidenciais a leis aprovadas pelo Congresso.

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Discutir o fim de todas as possibilidades de voto secreto apenas no calor do caso Donadon revela a simplificação de um debate que é muito mais complexo.

Em situações como a do deputado preso, o anonimato obviamente não faz o menor sentido. O Legislativo deve sim, de forma transparente, dizer se avaliza ou não a permanência na instituição de alguém condenado na esfera criminal com trânsito em julgado (sem possibilidade de recurso).

Mas há casos em que o voto secreto está a serviço da democracia. Na derrubada de vetos, assim como nas votações para a indicação de autoridades para altos cargos públicos, o voto secreto faz sentido porque é um instrumento capaz de proteger o parlamentar das pressões do Executivo e de interesses corporativos. Como se vê, o debate não é tão simples como se apresenta.

Por fim, o instrumento do voto secreto é algo muito importante para ser discutido a toque de caixa. O episódio demonstra que nosso Parlamento tem sido muito mais reativo do que propositivo, fato que certamente contribui para a sua imagem negativa junto à sociedade.

MARCO ANTONIO CARVALHO TEIXEIRA é professor do curso de administração pública da FGV-SP.

RAFAEL ALCADIPANI é professor do curso de administração de empresas da FGV-SP.


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