Folha de S. Paulo


Decreto de Sérgio Cabral é inconstitucional, diz presidente da OAB nacional

O presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Marcus Vinicius Furtado, afirmou que é inconstitucional o decreto assinado pelo governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), para investigar atos de vandalismo.

O decreto exige, entre outras coisas, que as empresas de telefonia e internet entreguem informações de usuários suspeitos de envolvimento com os protestos.

"A Constituição Federal assegura a inviolabilidade das comunicações entre pessoas. Não tenho a menor dúvida em afirmar que o decreto é flagrantemente inconstitucional", disse Furtado. "Apenas a Justiça detém o poder de determinar a quebra do sigilo", ressaltou.

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Ele informou que pedirá para a comissão de estudos de assuntos constitucionais da entidade avaliar a possibilidade de entrar com uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) contra a medida de Cabral.

Diz trecho do decreto publicado ontem no Diário Oficial do Estado: "As empresas operadoras de Telefonia e Provedores de internet terão prazo máximo de 24 horas para atendimento dos pedidos de informações da CEIV".

CEIV é a Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo em Manifestações Públicas, criada após a onda de protestos nas ruas do Rio. O governador tem sido o principal alvo dos manifestantes, que, nos últimos dias, organizaram protestos em frente à sua casa e na sede do governo, no Rio. Ontem, no primeiro dia de visita do papa Francisco à cidade, houve confronto de manifestantes com a polícia.

A comissão é formada por representantes do Ministério Público estadual, da Secretaria de Segurança e das polícias civil e militar. Procurada pela Folha, assessoria da Casa Civil defendeu o decreto e informou que o trecho dos dados telefônicos e de internet foi incluído a pedido do Ministério Público. "A natureza das investigações exige pronta resposta das empresas de telefonia e de internet em relação a informações solicitadas pela Comissão, seja diretamente, sejam as que dependam de mandado judicial", informou.

Outros especialistas da área jurídica também apontam que o decreto é inconstitucional. "Em estados democráticos de direito, a privacidade é uma garantia fundamental inalienável da sociedade. No Brasil, é a própria Constituição que assegura o sigilo das comunicações, que só pode ser vulnerado pelo juiz competente no bojo de processo criminal", disse Bruno Dantas, conselheiro do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). "Por isso, considero o parágrafo único do artigo 3° do Decreto do Governo do RJ escandalosamente inconstitucional", afirmou.

Para o advogado Técio Lins e Silva, que tem escritório no Rio, o decreto é um "abuso de poder". "É um delírio, abuso de autoridade. Eu recebi achando que era uma piada de internet. Isso é um escândalo. Quem edita um decreto desse está brincando com o Estado democrático", disse.

O decreto diz ainda que todas as solicitações feitas pela comissão aos órgãos públicos e privados do Rio "terão prioridade absoluta em relação a quaisquer outras atividades da sua competência ou atribuição".

O texto afirma ainda que a comissão poderá "tomar todas as providências necessárias à realização da investigação da prática de atos de vandalismo, podendo requisitar informações, realizar diligências e praticar quaisquer atos necessários à instrução de procedimentos criminais com a finalidade de punição de atos ilícitos praticados no âmbito de manifestações públicas".


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