Folha de S. Paulo


Análise: Origem da proposta de Dilma está em lacuna do Congresso

Pode a presidente Dilma Rousseff, ou o Congresso, convocar uma constituinte limitada para fazer a reforma política por meio de um plebiscito eventualmente aprovado pelos eleitores?

Será esta convocação do plebiscito constitucional? O que poderia ter levado a presidente à proposta tão arriscada?
Esta seria uma tentativa de solução para um problema específico. A origem dos protestos das ruas estaria na incapacidade do atual Congresso Nacional em fazer as reformas que o país há décadas necessita.

O Congresso deixou um vácuo político. E quem está ocupando este vácuo político é o Supremo Tribunal Federal quando decide sobre infidelidade partidária, criação de novos partidos, acesso a tempo de televisão, etc.

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Esta proposta seria ao mesmo tempo contra um Congresso Nacional paralisado e um Supremo ativista. No fundo diz: já que o Congresso não decide por emendas e novas leis e negociação, terá que decidir por imposição popular.

E mais: tendo sido uma decisão do povo brasileiro por meio de um plebiscito, o Supremo Tribunal Federal não poderá depois interferir na proposta eventualmente aprovada.

Terá sido este fundamento da proposta? Não sabemos. A presidente necessita agora detalhar sua proposta. Abrir o debate é um ato político insuficiente.

A presidente deve ter seus argumentos. Os eleitores brasileiros têm o direito de serem esclarecidos.

Hoje a Constituição não prevê esta convocação. Plebiscito para fazer lei, pode. Plebiscito para fazer Constituição, mesmo que apenas parte dela, extrapola o poder do próprio Congresso. Não pode.

Para o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto, além de não prever, a Constituição proíbe. Só existe Assembleia Constituinte, mesmo limitada, quando a atual Constituição não serve mais.

A atual Constituição está em vigor. Os poderes constituídos também. O risco para a democracia brasileira é de precedente de constituintes mesmo limitadas, feitas por maiorias ocasionais.

Mas se a presidente busca a legitimidade da reforma política através do plebiscito, algo é desde logo certo. Quem for decidir a reforma politica não pode se candidatar a nada, para dela não se aproveitar. Pois este é o nó a desatar.

JOAQUIM FALCÃO é professor de direito constitucional da FGV Direito Rio


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