Folha de S. Paulo


Senado aprova indicação de Barroso ao Supremo

Por 59 votos favoráveis e seis contrários, o Senado aprovou nesta quarta-feira (5) a indicação do advogado Luís Roberto Barroso para o Supremo Tribunal Federal. Com isso, Barroso vai assumir a cadeira do ex-ministro Carlos Ayres Britto, que deixou a corte em novembro do ano passado.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), atrasou o início das votações no plenário da Casa para assegurar que os senadores votassem a indicação do advogado menos de uma hora depois de a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) aprová-la.

Barroso disse que espera "servir ao Brasil" e fazer o "melhor possível" como novo ministro do STF. "Saio de uma vida como professor, advogado, na qual sou muito feliz. Estou indo para o Supremo, não precisava sair de onde estava. Espero poder fazer o melhor possível e servir ao Brasil. A minha vida foi boa em todos os sentidos. Estar no Supremo é uma perspectiva do que recebi", afirmou.

Andre Borges/Folhapress
Luís Roberto Barroso, na sabatina do Senado
O advogado Luís Roberto Barroso, na sabatina do Senado

Após sabatina na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, que durou sete horas, Barroso disse que vai manter sua posição de independência nos julgamentos da corte. "Na minha vida, graças a Deus, tenho podido fazer as coisas da forma e do conteúdo que eu acho que elas devem ser feitas. Durmo bem com isso, pretendo continuar sendo a mesma pessoa, que trata todo mundo com respeito e consideração, depois decide de acordo com a própria consciência."

O advogado evitou falar sobre o julgamento do mensalão, do qual deve participar da análise dos recursos dos réus, mas disse que foi um dos casos em que os ministros foram mais "duros" na história da corte. O STF ainda vai analisar recursos dos réus e definir se cabe novo julgamento nos crimes de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

"Analisando outros casos, o Supremo manteve sua posição mais libertária em matéria penal. No caso do mensalão, os juízes foram mais duros por muitas circunstâncias que não quero, nem estou em condições de avaliar", afirmou.

Durante a sabatina, Barroso disse que o julgamento foi um "ponto fora da curva" e que não vai agir por pressão "nem do governo, nem da opinião pública, nem de acusados, nem da imprensa" ao analisar o caso. Senadores da oposição cobraram que ele vote no caso de acordo com as suas convicções, sem pressões do governo ou PT.

A oposição e a base aliada do governo apoiaram a indicação de Barroso, feita pela presidente Dilma Rousseff --com elogios à sua escolha. "Dessa vez, a presidente acertou. Vossa Excelência preenche todos os requisitos necessários para chegar à corte", disse o senador Aécio Neves (PSDB-MG). "Vossa Excelência é uma feliz indicação da presidente", completou o senador José Agripino Maia (DEM-RN).

Barroso revelou que se encontrou com a presidente Dilma Rousseff antes da sua indicação para o Supremo para discutirem questões "republicanas". No encontro, Barroso disse que foi "sabatinado" pela presidente, que o questionou sobre diversos assuntos, mas negou que tenha se comprometido com Dilma a defender questões de interesse do governo na corte.

"Eu não sei como cheguei aqui. Não tinha articulação política. Fiquei muito honrado, surpreso", afirmou.

Além de Dilma, Barroso disse que foi sondado pelo ex-deputado Sigmaringa Seixas e pelo ex-secretário da Casa Civil Beto Vasconcelos sobre a indicação. Perto da definição do seu nome, o advogado disse que também conversou com o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça). Na conversa com a presidente, o advogado disse que tratou de questões como separação de poderes, conflitos federativos e royalties.

CONGRESSO X SUPREMO

A análise da indicação de Barroso ocorreu em meio à troca de farpas entre a cúpula do Congresso e do STF sobre supostas interferências do Judiciário em decisões do Poder Legislativo. Apesar de fazer afagos ao Congresso, o advogado defendeu a atuação da Justiça nos casos em que o Legislativo deixar de legislar.

"Quando o Congresso atua, o Judiciário não deve atuar. Ao menos que haja afronta à Constituição. Quando o Legislativo não atua, mas existem direitos em jogo, o Judiciário precisa atuar."

Em defesa da atuação do Judiciário, o futuro ministro disse que o Poder deve agir para preencher lacunas deixadas pelo Legislativo, mas sem interferir diretamente em suas atribuições. "Acho ruim para o país que o Supremo se transforme em terceiro tempo da disputa política do Congresso", afirmou.

Na sabatina, o advogado fez uma defesa da "tolerância" do pensamento plural --seja ele religioso, político ou racial. Alvo de críticas da bancada evangélica do Congresso por ter defendido, como advogado, temas como aborto de fetos anencéfalos e uniões homoafetivas, Barroso disse que a marca do mundo contemporâneo é a "pluralidade".

"Creio na tolerância. A marca do mundo contemporâneo é a pluralidade, diversidade, de religiões, de origens, de política. Nós vivemos a época da tolerância. A época em que se deve respeitar todas as possibilidade razoáveis de vida boa. A verdade não tem dono. Existem muitas formas de se feliz, cada um é feliz à sua maneira e desde que não esteja interferindo à igual possibilidade de outrem", afirmou.
Durante a sabatina, ele não foi questionado por integrantes da bancada evangélica. Na votação em plenário, o senador Magno Malta (PR-ES) disse que discorda da sua indicação porque ele defende temas que "a maioria da população não concorda". "Ele vai para um tribunal superior. Depois daquele tribunal, só tem Deus. O bem e o mal da vida das pessoas é decidido ali", disse o senador.

Barroso reiterou na sabatina sua defesa do aborto de fetos anencéfalos até o terceiro mês de gestação, como defendido pelo advogado no STF durante o julgamento da questão. Ele disse que não há possibilidade de fetos anencéfalos sobreviverem ao nascimento, por isso a mãe deve ter o direito de interromper a gravidez.

"Obrigar a gestante a enfrentar todas as transformações, se preparando para chegar um filho que não vai vir, esse é um sofrimento que pode ser evitado."

O advogado também defendeu a decisão do STF que autorizou a união civil homoafetiva ao afirmar que cabe à Corte defender os direitos de minorias. "As minorias não são protegidas pelo sistema legislativo, em toda parte do mundo. Considero que a matéria que uma Corte de Justiça pode ser mais expansiva é quando existe uma minoria desprotegida. Talvez essa seja a atuação mais marcante do Judiciário se posicionar."

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