Folha de S. Paulo


Governo vai enviar Força Nacional para área de conflito com índios em MS

O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) anunciou na noite desta terça-feira (4) que autorizou o envio de 110 homens da Força Nacional para atuar na região de Sidrolândia (MS), onde um índio da etnia terena morreu na última quinta-feira (30) durante uma reintegração de posse na região. Nesta terça-feira, em novo confronto, um índio foi baleado nas costas.

Os homens irão de avião e por terra já na noite desta terça, e deverão ficar à disposição de Mato Grosso do Sul por tempo indeterminado.

Índio é baleado nas costas em novo conflito em MS
Justiça diz que reintegração de posse em área de conflito em MS está mantida
Índios protestam contra mudança na política de terras

Cardozo disse também que irá ampliar o efetivo da Polícia Federal no Estado, uma vez que, na visão do governo, um dos motivos que levaram ao acirramento dos conflitos na região foi falta de pessoal da corporação. Atuaram na reintegração de posse, além de homens da PF, a Polícia Militar do Estado.

"O governador [André] Puccinelli pediu ao Ministério da Justiça a Força Nacional para que pudéssemos atuar na regição de Sidrolândia, em razão da elevação dos conflitos na região na tarde de hoje. O pedido dele já chegou, nós deferimos, e amanhã de manhã nós já estaremos embarcamos homens da Força Nacional --uma parte vai por via aérea, uma parte vai por via terrestre. 110 homens da Força Nacional", disse Cardozo.

A Folha mostrou na edição desta terça-feira que Puccinelli enviou ofício à Casa Civil um dia antes da morte do índio em Sidrolândia, no qual relata "clima de iminente conflito no campo" e alerta para o risco de "confrontos violentos".

O documento cita Sidrolândia como um dos "focos de conflito" e aponta para um "cenário de insegurança jurídica" que se espalha por toda a região sul do Estado, bem como clima de "iminente conflito no campo".

O prazo para a desocupação da fazenda Buriti, palco dos conflitos dos últimos dias, se encerra nesta quarta-feira (5) pela manhã. O ministro não deixou claro se a Força Nacional e a Polícia Federal atuarão na eventual desocupação das terras. O governo federal atua para prorrogar o prazo para que os índios saiam da propriedade.

Marcos Tome/Região News
Índios terenas rasgam decisão de reintegração em fazenda onde índio morreu após confronto com a PF
Em MS, índios terenas rasgam decisão de reintegração de posse em fazenda onde índio morreu após confronto com a PF

RADICALISMO

Em entrevista a jornalistas, Cardozo afirmou que o governo não tomará "medidas radicais" para conter os confrontos na região. "É muito importante que nessa hora se busque colocar a mensagem que o radicalismo não resolverá o problema", disse Cardozo. "Não é com radicalismo, de lado a lado, tentando apagar uma fogueira com álcool que nós vamos resolver uma situação que infelizmente se acumula na história brasileira", completou.

O governo está dividido entre pagar multa milionária e a retirada dos índios da área da fazenda Buriti, conforme determinou a Justiça. Segundo a AGU (Advocacia-Geral da União), a decisão judicial afirma que o governo será obrigado a pagar R$ 1 milhão ao dia em multa caso não desocupar a terra. A Funai no Estado também terá que pagar R$ 28 mil.

A AGU ingressará com recurso até na manhã desta quarta-feira pedindo mais prazo à Justiça para garantir "uma desocupação pacífica".

"Estamos obrigados [a cumprir] as ordens judiciais, mas é muito importante que possamos [buscar] o diálogo, o entendimento pois só dessa forma conseguiremos fazer que o direito de todos sejam respeitados", disse o ministro.

Em entrevista, Cardozo afirmou que conversou por telefone com o governador do Mato Grosso do Sul, André Puccinelli (PMDB), enquanto recebia visita de parlamentares do Estado na tarde de ontem.

DEMARCAÇÕES

O ministro afirmou que o governo não "pretende tirar o protagonismo da Funai (Fundação Nacional do Índio) na demarcação de terras indígenas".

Segundo ele, o ministério está "trabalhando em um conjunto de normas que visam aperfeiçoar o processo de demarcação, e não enfraquecer a Funai ou fazer concessões a quem quer que seja", disse.

"Há muita confusão. Há pessoas tirando conclusões e avaliações antes desse [conjunto de normas] ser [feito]. Estamos tentando ter mais informações para ter menos judicialização e menos conflitos", disse.

"Se não divulgarmos com exatidão eu acabo [colocando] querosene numa fogueira. A Funai tem um papel importantíssimo e continuará tendo nas demarcações."

PROTESTOS

Com bloqueios de rodovias e até invasão de um diretório do PT, índios reagiram ontem contra a decisão do governo de alterar a política de demarcação de terras indígenas no país. O governo planeja estabelecer novo modelo de demarcação das reservas até o fim deste mês.

Na região Sul, em protestos articulados, índios invadiram a sede do PT em Curitiba, enquanto outros grupos bloquearam quatro rodovias no Rio Grande do Sul.

Em Mato Grosso do Sul, onde um índio foi morto na semana passada em confronto com a Polícia Federal, indígenas iniciaram uma marcha de 60 km para denunciar a tensão fundiária no Estado.

O estopim da reação é a decisão do Planalto de ampliar, até o fim do mês, o poder de órgãos ligados à agricultura na demarcação de terras indígenas, reduzindo o poder da Funai (Fundação Nacional do Índio) nesses processos.

A ideia é que laudos da Funai, usados para subsidiar o reconhecimento oficial de terras indígenas, sejam confrontados com informações de outros órgãos, como a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), o que atualmente não ocorre.

Segundo a ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil), a meta é oficializar a participação de órgãos ligados à agricultura nas delimitações. Hoje, a prerrogativa legal para emitir laudos é da Funai.


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