Folha de S. Paulo


Mais um membro da Comissão da Verdade diz ser contra revisão de Anistia

Integrante de Comissão Nacional da Verdade, José Paulo Cavalcanti afirmou à Folha ser contra a revisão da Lei da Anistia, que garante a não punição aos culpados por mortes, torturas e desaparecimentos ocorridos na ditadura militar (1964-1985).

"Não [sou a favor da revisão]. Em defesa do princípio da legalidade, sagrado na Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. 11 ) e na Convenção americana sobre Direitos Humanos ( art. 9 )", disse.

Governo não vai agir para alterar Lei da Anistia, diz ministro
Comissão da Verdade fala em rever Lei da Anistia, mas ministro se opõe

Leo Caldas - 22.mar.2011/Folhapress
José Paulo Cavalcanti, membro da Comissão Nacional da Verdade
José Paulo Cavalcanti, membro da Comissão da Verdade

"O fato de que o Brasil não subscreveu a Convenção sobre Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade, de 1968. E aderiu à Corte Interamericana de Direitos Humanos em 2002, e apenas (formalmente) para fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998. Sem contar que o STF [Supremo Tribunal Federal] já se pronunciou nesse sentido [corroborando a atual interpretação], sobre o tema. As razões jurídicas são essas."

Para ele, a responsabilização dos envolvidos nos crimes hoje anistiados deve "sem dúvida" ocorrer "no plano moral" pois "a tortura está abaixo dos limites da dignidade humana". "[Mas] juridicamente não, pelas razões acima."

Ele é o segundo dos sete membros do colegiado que diz discordar de uma eventual alteração do atual entendimento da lei. Ontem (22), o ex-ministro da Justiça José Carlos Dias afirmou à reportagem ter a mesma opinião.

Polêmica central desde que a criação da comissão passou a ser cogitada, ainda no segundo governo Lula, a questão voltou a ser discutida nesta semana.

Na segunda-feira, dois outros integrantes, Rosa Cardoso e Paulo Sérgio Pinheiro, afirmaram, após questionamento, serem favoráveis à responsabilização dos agentes públicos ligados às graves violações aos direitos humanos. Claudio Fonteles também disse à Folha concordar com a revisão. Maria Rita Kehl e Gilson Dipp (que, doente, está afastado dos trabalhos) não se pronunciaram.

A comissão irá discutir se recomendará, em seu relatório final, alguma maneira de efetuar essa responsabilização. Uma eventual recomendação não terá de ser obrigatoriamente cumprida. Na prática, agentes só poderão um dia ser punidos se o STF reanalisar a questão, voltar atrás e entender que a anistia não vale para as graves violações --como as mortes, torturas e desaparecimentos.

Questionado sobre a possibilidade da recomendação, Cavalcanti disse: "Não penso que esteja dentro de suas atribuições [da comissão]. Como pessoas, a partir de suas convicções (e se for o caso), sim. Como Comissão da Verdade, não".

Não estão definidos os mecanismos que serão usados para decidir o que se fazer se parte dos membros for a favor de uma recomendação e outra parte não.


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