Folha de S. Paulo


Governo consegue aprovar MP dos Portos após 22h de votação

Em uma das mais longas discussões de sua história, com dois dias de sessões e mais de 37 horas de debates --cerca de 22h no último dia-- e bate-bocas, o governo conseguiu concluir nesta quinta-feira (16) a aprovação na Câmara dos Deputados do projeto que reformula o sistema portuário brasileiro.

A conclusão da análise da Medida Provisória dos Portos só ocorreu depois que o Palácio do Planalto cedeu e aceitou alterações propostas pelo PMDB, principal aliado no PT na coalizão de apoio a Dilma Rousseff.

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A votação, no entanto, tem potencial para arranhar a relação do governo com a base aliada, além de ter exposto um racha entre PT e PMDB com troca de acusações publicamente.

Agora, a medida segue para análise do Senado, que convocou uma sessão extraordinária para as 11h.

O presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse que fará o possível para "excepcionalizar" os prazos e votar a MP até a meia noite, período depois do qual ela perde a validade.

Como terão pouco tempo para analisar a proposta, senadores da oposição prometem ir ao Supremo Tribunal Federal pedindo a anulação da sessão do Senado.

A medida provisória, que abre o setor portuário e cria competição entre portos públicos e privados, gerou uma guerra entre operadores de portos públicos, como Santos Brasil e Libra, e grupos empresariais interessados em portos privados, como o de Eike Batista e o da Odebrecht.

Há também questões políticas, como o ponto defendido pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), que quer manter com os Estados a decisão sobre licitações em portos regionais, como o de Suape.

Editoria de Arte/Folhapress
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AUSÊNCIAS

A segunda sessão para votar a medida provisória, que começou ontem e durou mais de 22 horas, quase foi inviabilizada pela ausência de parlamentares da base aliada, que deixaram o plenário diante das manobras regimentais patrocinadas pela oposição, prolongando a votação. A sessão levou mais de seis horas para que a base conseguisse reunir ao menos 257 deputados no plenário da Casa.

A oposição, que viu todas todas as suas sugestões de mudanças no texto derrotadas ao longo da noite, ainda tentou surpreender os governistas e pediu verificação da presença no momento da análise da redação final. Só após essa última votação seria possível enviar a medida provisória ao Senado.

Por volta de 7h desta quinta-feira (16), os governistas, que deflagraram uma espécie de "operação despertador" para tirar parlamentares de Casa durante toda a madrugada, conseguiram, enfim, concluir a análise da proposta, com 281 presentes.

Pouco antes da mobilização, porém, líderes governistas admitiam jogar a toalha, mas foram pressionados pelo Planalto a insistir na votação.

A manobra irritou o deputado Vanderlei Macris (PSDB-SP), que rasgou o Regimento da Casa no meio do plenário.

DISCUSSÃO ENTRE ALIADOS

Durante a votação, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), o líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e o líder do PT, José Guimarães (CE), trocaram farpas no plenário.

Os petistas sinalizaram que culpavam Alves pelo atraso na votação. A insinuação era de que ele teria beneficiado a oposição, não sendo enérgico na condução da sessão e sem barrar os artifícios usados para prolongar a votação.

O racha provocou um novo mal-estar entre os dois partidos, que se estranharam ao longo das negociações do texto.

Ontem, inclusive, o governo foi obrigado a ceder parcialmente ao líder da bancada do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), um dos principais personagens de oposição ao texto principal da Medida Provisória dos Portos.

Foi aprovada uma emenda que permite, desde que sejam feitos investimentos em modernização, a renovação de contratos de concessão de terminais em portos públicos firmados depois de 1993 e que ainda não venceram.

A ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil), porém, já indicava ontem que a presidente Dilma Rousseff poderia vetar mudanças aprovadas na Câmara com as quais o Planalto não concordasse. "A presidente pode usar de sua prerrogativa de veto, isto será analisado pelo governo."

A emenda aprovada ontem é uma das possibilidades de veto, mas como o texto diz apenas que haverá a possibilidade de renovação, sem uma obrigação, os técnicos podem recomendar a sanção da mudança.

A previsão da renovação era um dos pontos rejeitados inicialmente pelo Planalto e chegou a ser chamada pelo líder do PR, Anthony Garotinho (RJ), de "emenda Tio Patinhas". De acordo com ele, seus defensores estariam agindo em prol de empresas que atuam hoje nos portos públicos.

Nos últimos dias, o governo mobilizou aliados, negociou liberação de emendas parlamentares e prometeu acelerar a nomeação de indicações em estatais com o objetivo de derrotar Cunha.

Antes de ceder ao peemedebista, integrantes do Planalto falavam em vitória sobre ele diante das emendas rejeitadas na sessão de terça-feira.

A situação mudou para os governistas, que viam o prazo se esgotar a cada novo ponto de discórdia, quando a oposição apresentou cinco novas propostas de modificações no texto, elevando o total para 17 emendas ainda pendentes de votação ainda na noite de ontem.

Para piorar o cenário, em meio às discussões, vários parlamentares abandonaram o plenário e foram se refugiar no anexo conhecido como "cafézinho". Lá, se serviram de galinhada e arroz carreteiro. Muitos aproveitaram para assistir futebol na TV -- o jogo que eliminou o Corinthians da Libertadores.

Colaboraram ANDREZA MATAIS, BRENO COSTA E VALDO CRUZ


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