Nos recursos apresentados ao STF (Supremo Tribunal Federal) contra as condenações no processo do mensalão, a defesa dos réus, em sua maioria, faz críticas ao acórdão do julgamento --documento final com os votos dos ministros. Acusam a Corte, entre outros, de omissão e incoerência no documento, prejudicando um entendimento claro do que foi decidido na ação penal.
Os 25 réus condenados no processo entraram com recursos contra a decisão. O prazo para a apresentação dos pedidos venceu nesta quinta-feira (2).
Leia a íntegra do acórdão (parte 1), (parte 2), (parte 3), (parte 4), (parte 5)
Saiba quais são as penas de cada réu no julgamento do mensalão
Em um dos casos, o advogado Marcelo Leonardo, que defende o empresário Marcos Valério, afirma que "falta um voto do ministro Celso de Mello" por ele ter cancelado boa parte das intervenções feitas em plenário. Segundo a defesa do operador do esquema, o mesmo aconteceu com o voto do ministro Luiz Fux, que optou por apagar as suas declarações feitas no decorrer do julgamento.
Outro ponto em comum em ao menos três dos recursos --do ex-ministro José Dirceu, do ex-deputado Roberto Jefferson e do ex-diretor do Banco Rural José Roberto Salgado -- é a tentativa de evitar que os pedidos dos réus sejam relatados pelo atual presidente do STF e relator do processo, Joaquim Barbosa.
Considerado linha dura na condução do processo, Barbosa protagonizou embates com advogados durante o julgamento e recusou diversos pedidos das defesas ao longo da ação.
O argumento para a troca de relator, no entanto, é a previsão regimental de que o presidente da Corte não deva relatar novos processos.
O STF encerrou no fim de 2012 o mais longo julgamento de sua história, que durou quatro meses e meio e acabou com 25 réus condenados. A corte concluiu que o esquema foi organizado pela antiga cúpula do PT com a ajuda do empresário Marcos Valério. Seu objetivo, segundo os ministros, era comprar apoio para o governo no Congresso.
Os recursos permitidos nesta fase do julgamento são os chamados embargos declaratórios, usados para solicitar esclarecimentos sobre pontos da decisão.
Somente depois do julgamento deste primeiro recurso é que os réus poderão tentar os chamados embargos infringentes, que podem permitir um novo julgamento em relação às condenações com mais de quatro votos contrários.
Veja abaixo um resumo e a íntegra de cada recurso: (a reportagem ainda não teve acesso a todos os documentos)
José Dirceu
Sérgio Lima/Folhapress |
No recurso apresentado ao Supremo, o advogado do ex-ministro José Dirceu, José Luis Oliveira Lima, não tenta em nenhum momento provar a inocência de Dirceu em relação ao entendimento do Supremo de que ele cometeu os crimes de corrupção ativa e quadrilha. Se concentra, porém, em apresentar argumentos de que as penas foram calculadas erroneamente e podem ser reduzidas --e que, se aceitos, livrariam o ex-ministro do regime fechado.
Em recurso, Dirceu pede que penas por mensalão sejam reduzidas
José Genoino
Sérgio Lima/Folhapress |
Em um longo recurso de mais de 200 páginas, a defesa do deputado José Genoino (PT-SP) classifica como "injusta" a condenação do petista sob o argumento de que ocorreu sem provas e com base apenas em ilações. Os advogados pedem a redução da pena de seis anos e 11 meses de prisão e apontam que ele foi condenado pela "imaginária" compra de votos no Congresso. Os advogados ainda colocam em dúvida a credibilidade do presidente do PTB, Roberto Jefferson, delator do esquema.
Recurso de Genoino ao STF diz que condenação no mensalão é injusta
Delúbio Soares
Alessandro Shinoda/Folhapress |
A defesa do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares apresenta duras críticas ao acórdão --documento com o resultado final do julgamento. No recurso, o petista pede um novo julgamento na primeira instância da Justiça, pois não tem foro privilegiado. O advogado de Delúbio também qualifica os votos dos ministros como uma "colcha de retalhos", "ilegíveis" e aponta que há "situações que beiram o ridículo". Os adjetivos são utilizados para ilustrar o que chama de omissões e contradições dos integrantes do Supremo.
Defesa de Delúbio diz que acórdão do mensalão 'beira o ridículo'
Marcos Valério
Marcelo Prates/Hoje em Dia/Folhapress |
O recurso do empresário Marcos Valério pede a anulação da decisão final do julgamento (acórdão) e questiona pontos da decisão dos ministros no caso. Segundo o seu advogado, Marcelo Leonardo, a "pressão da mídia" e reclamações públicas do presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, para que os colegas agilizassem a revisão de seus votos, levaram o tribunal a editar um acórdão omisso e obscuro. Afirma também que a Corte não considerou documentos da defesa.
Em recurso, Valério diz que acórdão do mensalão é omisso e obscuro
Cristiano Paz
Lula Marques/Folhapress |
Entre as contestações apresentadas em seu recurso, o ex-sócio de Marcos Valério diz que os ministros do Supremo desprezaram documentos enviados para provar sua inocência, não consideraram parte de depoimentos que seriam benéficos ao réu e ainda suprimiram do acórdão as falas dos ministros Luiz Fux e Celso de Mello.
Ex-sócio de Valério pede anulação do acórdão do mensalão
Ramon Rollerbach
Euler Junior/Estado de Minas/Folhapress |
A exemplo de outros réus, a defesa de Ramon Hollerbach pede que o recurso não seja relatado pelo ministro Joaquim Barbosa, atual presidente do tribunal. Em documento de mais de 90 páginas, o advogado do ex-sócio de Valério também afirma, entre outros pontos, que os ministros do Supremo ignoraram provas testemunhais que atestariam a sua inocência.
Ex-sócio de Valério cobra do Supremo provas para condenação
Rogério Tolentino
Alan Marques/Folhapress |
O ex-advogado de Valério contesta a pena de 3 anos recebida pelo crime de corrupção ativa. Segundo ele, os deputados envolvidos no caso foram punidos com base em uma lei antiga, que definia a pena entre 1 e 8 anos de prisão, enquanto a sua pena foi calculada com base em uma atualização da legislação, que prevê a pena mais alta --de 2 a 12 anos.
Ex-sócio de Valério apresenta primeiro recurso na ação do mensalão
Simone Vasconcelos
Sérgio Lima/Folhapress |
A defesa da ex-funcionária da agência de publicidade SMP&B pede no recurso a redução da pena imposta durante o julgamento. Ela afirma que teve uma participação menor no caso e que só cumpria ordens. Também diz que as multas aplicadas são desproporcionais e não observaram seu patrimônio pessoal.
Seus advogados também afirmam haver omissão do acórdão do julgamento, prejudicando o entendimento a respeito da decisão final sobre o caso.
Kátia Rabello
Sérgio Lima/Folhapress |
A defesa da dona do Banco Rural Kátia Rabello afirma que a pena atribuída a ela -- de 16 anos e 8 meses -- é "injusta e desproporcional", superior às penas para casos de homicídio e extorsão mediante sequestro. Também afirma que Rabello o mesmo fato --empréstimos fraudulentos-- foi utilizado para condená-la por dois crimes distintos.
José Roberto Salgado
Alan Marques/Folhapress |
No recurso apresentado por Márcio Thomaz Bastos, advogado do ex-dirigente do Banco Rural José Roberto Salgado, a defesa afirma que é "chocante" ver as "incontáveis supressões de intervenções orais feitas, ao longo das sessões, pelos eminentes Julgadores". Logo no início do recurso, ele também pede o afastamento de Joaquim Barbosa da relatoria do mensalão. O advogado diz ainda que seu cliente foi condenado por dois crimes baseados nos mesmos fatos;
STF julgou mensalão a "toque de caixa", diz Thomaz Bastos
Vinícius Samarane
Nos embargos contra o acórdão do mensalão, o advogado Maurício de Oliveira Campos Júnior, defensor do ex-executivo do Banco Rural Vinícius Samarane, registra que a supressão no acórdão das manifestações do ministro Celso de Mello durante o julgamento tornaram ininteligível significativa parte dos debates.
O documento questiona também o critério adotado para aumentar a pena de Samarane, considerando a reiteração dos saques de parlamentares das quantias movimentadas pelo esquema como crime continuado.
Jacinto Lamas
Caio Guatelli/Folhapress |
A defesa de Jacinto Lamas, ex-tesoureiro do extinto PL (atual PR) afirma desproporcionalidade na pena aplicada ao réu pelo crime de lavagem de dinheiro, comparada a de Valdemar da Costa Neto, então presidente da legenda.
Baseada na comparação, a defesa pede redução da pena aplicada ao réu.
João Paulo Cunha
Danilo Verpa/Folhapress |
A defesa do deputado João Paulo Cunha (PT-SP) afirma, em recurso enviado ao STF, que os ministros utilizaram critérios "discrepantes" para o cálculo das penas do mensalão, apesar de considerarem que os crimes foram cometidos em "circunstâncias quase idênticas". No documento, o advogado pede que o tribunal rediscuta a questão da perda de mandato dos réus condenados por entender que os argumentos utilizados foram "obscuros".
Critérios do STF no mensalão são incompreensíveis, diz defesa de João Paulo
Roberto Jefferson
Leonardo Wen/Folhapress |
O recurso do delator do mensalão Roberto Jefferson pede que o ministro Joaquim Barbosa não seja mais o relator do processo. Segundo sua defesa, por ter assumido a presidência do STF, Barbosa não pode mais ser o relator. O advogado de Jefferson avalia que esse posto deve ser repassado ao ministro que substituir Carlos Ayres Britto, que se aposentou em novembro de 2012, na reta final do julgamento.
Jefferson apresenta recurso do mensalão e pede novo relator
Emerson Palmieri
Sérgio Lima/Folhapress |
Em um dos menores recursos apresentados, a defesa do ex-funcionário do PTB Emerson Palmieri alega que a Corte não observou a situação econômica do réu ao fixar a multa e pede a redução da pena. "Não foi explicado, no acórdão, o fato motivador da quantidade e do valor da multa que foi imposta ao embargante", afirma o recurso.
Carlos Rodrigues
Alan Marques/Folhapress |
A defesa do ex-deputado Carlos Alberto Rodrigues Pinto, conhecido como Bispo Rodrigues, pediu ao STF que julgue seus embargos de declaração de forma mais ampla, analisando o seu caso novamente. No recurso, os advogados argumentam que o ex-deputado não terá o direito constitucional de recorrer da condenação a um outro tribunal. Rodrigues era líder do então PL na época do escândalo do mensalão em 2005. Por recebimento de propina para garantir o apoio de seu partido aos projetos de interesse do governo Lula, o ex-deputado foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Defesa do ex-líder do PL nega compra de apoio político no caso do mensalão
Pedro Corrêa
Alan Marques/Folhapress |
No recurso apresentado ao Supremo, a defesa do ex-deputado Pedro Corrêa aponta erro de cálculo por parte da Corte ao determinar a pena.
Os advogados citam como exemplo o fato de os ministros considerarem para totalização da pena o crime de formação de quadrilha, crime pelo qual ele foi absolvido
Romeu Queiroz
Alan Marques/Folhapress |
A defesa do ex-deputado do PTB Romeu Queiroz pediu a redução da pena de seis anos e seis meses de prisão imposta a ele pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no julgamento do mensalão. Segundo os advogados, o Supremo foi omisso ao não analisar provas apresentadas pela defesa que revelariam a participação do deputado em um acerto de contas de campanha, e não de compra de apoio político nos primeiros anos do governo Lula, como confirmou o tribunal.
Defesa de Romeu Queiroz pede redução da pena no mensalão
Valdemar Costa Neto
Saulo Cruz/Agência Câmara |
Segundo os advogados do deputado federal, os integrantes do Supremo citaram durante o julgamento que ele patrocinou um acerto de contas de campanha do PT com seu antigo partido, o PL, mas o condenaram por participar de um esquema de compra de votos no início do governo Lula.
Em recurso ao STF, Valdemar aponta contradição de ministros sobre mensalão