Folha de S. Paulo


Presidente da Câmara diz que vai atrasar projeto que opõe Congresso ao STF

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), disse ter estranhado a decisão do Supremo Tribunal Federal de suspender temporariamente a tramitação do projeto que inibe a criação de novos partidos. Mas, em um gesto de distensão no que classificou de abalo entre os Poderes, comprometeu-se a adiar a instalação de uma comissão para estudar uma proposta que tira poderes do STF.

A ideia, gestada pelo PT, foi aprovada ontem pela Comissão de Constituição e Justiça na Câmara. A CCJ abriga entre seus membros deputados condenados no julgamento do mensalão: João Paulo Cunha (PT-SP) e José Genoino (PT-SP).

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STF suspende tramitação de projeto que inibe novos partidos

Ela foi criticada por ministros do STF ontem, inclusive Gilmar Mendes, que no fim da noite suspendeu em liminar a análise do projeto que restringe o amplo acesso de novos partidos ao fundo partidário e ao tempo de TV, benefícios vitais para as siglas, que foi aprovado na Câmara e está no Senado.

Leia a íntegra da decisão do Supremo
Leia a proposta aprovada na CCJ da Câmara

A proposta tem aval do Planalto e esvazia a movimentos como da ex-senadora Marina Silva que tenta viabilizar um novo partido, a Rede Sustentabilidade, de olho na disputa presidencial de 2014.

Sergio Lima - 12.mar.2013/Folhapress
O deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) discursa em sessão no plenário da Câmara; ele admite que medida causou atrito entre Poderes
Henrique Eduardo Alves discursa em sessão no plenário da Câmara; ele admite que medida causou atrito entre Poderes

Segundo Alves, não há justificativa para a suspensão do projeto. Ele disse que vai conversar com ministros para acelerar uma decisão final do plenário da Corte sobre o tema.

"Nós estranhamos muito porque é uma decisão soberana dessa Casa de forma democrática, transparente, cumpriu todos os preceitos regimentais e, portanto, achamos estranha e não concordamos com ela. Vamos ver de que maneira o [julgamento] seja levado rápido [ao plenário] para que haja decisão correta em relação aos poderes e decisões dessa casa", disse.

O despacho de Mendes ocorreu horas depois da aprovação da admissibilidade de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que submete decisões do Supremo ao crivo do Congresso. O texto precisa passar para análise de uma comissão especial e depois por votação em dois turnos no plenário da Câmara, com 60% dos votos em cada.

Alves reconheceu que a PEC abala a relação entre os Poderes.

"É porque o Judiciário pode entender que está interferindo em seus poderes, na relação de harmonia que tem que haver entre Judiciário e Legislativo. Foi uma decisão que nos surpreendeu e estou verificando, mas como a comissão especial nos compete instalar enquanto não houver essa coisa clara, transparente, respeitosa, não farei."

Para o peemedebista, não há uma relação entre a PEC e o julgamento do mensalão pelo STF. Ele não vê como retaliação. "Não acredito. Isso é coisa muito menor".

O ministro do STF José Antônio Dias Toffoli também afirmou não ver "crise" nem "retaliação" na relação do Judiciário com o Legislativo, mas "Poderes funcionando".

Segundo Toffoli, o país vive atualmente uma democracia efervescente. "Não ha que se falar em crise, não há o que se falar em retaliação. Isso não procede. O que temos é uma democracia muito ativa. Quem quer ver crise nisso, quer criar crise porque não há", disse.

Para Toffoli, a decisão de Mendes foi tomada dentro dos parâmetros constitucionais. "O Congresso tem todo o direito de deliberar e Supremo age dentro dos parâmetros da Constituição", disse. "Vivemos uma democracia efervescente. Ruim seria se o Congresso ou o Judiciário não estivessem atuando", completou.

REPERCUSSÃO

Petistas e aliados da presidente Dilma Rousseff também reagiram à decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de suspender o projeto que inibe a criação de novos partidos.

Com acusações de que o Judiciário interferiu numa decisão que é do Congresso, os governistas afirmam que a postura do Supremo "quebra a harmonia" entre os dois Poderes.

"O Supremo pode se manifestar sobre leis, mas interromper um processo de votação é algo absurdo. Imagine se o Congresso for definir quando o Supremo se reúne ou outras decisões que cabem aos ministros? Isso quebra a harmonia entre os Poderes", disse o senador Humberto Costa (PT-PE).

Para o líder do PT na Câmara, deputado José Guimarães (CE), Congresso e Judiciário terão que estabelecer "regras claras" de convivência para evitar embates. "Nesse tom entre Congresso e Judiciário, se não estabelecermos regras claras do que cabe ao nosso Congresso, vamos parar no fim do mundo", disse.

Mesmo contrário ao projeto que inibe novos partidos, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) afirmou ser "inaceitável" a interferência do Supremo na tramitação de um projeto que está no Senado.

"O Supremo interferir para impedir o Congresso de discutir uma matéria sem saber se ela vai ser aprovada, ou não, é um absurdo total. Isso não colabora para o equilíbrio entre os Poderes. Provoca a retaliação e o conflito."

Autor do projeto, o deputado Edinho Araujo (PMDB-SP) se disse "surpreso" com a decisão tomada ontem pelo ministro Gilmar Mendes, mas disse que deveria ser respeitada. O deputado afirma que não houve ilegalidades na tramitação da proposta pelo Congresso, com as votações respeitando o regimento da Casa. "A questão de dizer que o projeto é apressado é uma questão regimental interna do Congresso", afirmou o deputado.

Na contramão da maioria dos petistas, o senador Jorge Viana (PT-AC) não considerou a decisão do ministro Gilmar Mendes uma interferência no Congresso. "Não acho que seja interferência, é previsível esse tipo de ação. Foi de acordo com o que pensa o plenário do Senado. Vou conversar com os colegas do PT para ver como poderemos fazer essa articulação", afirmou.

Outro a defender a medida do Supremo foi o procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Ele afirmou que o STF está atuando no âmbito de suas competências e, por enquanto, "não vê embate entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal". "A decisão se insere na competência do STF. Isso será posteriormente enviado à Procuradoria-geral e eu me pronunciarei".

Para o procurador-geral, há um fenômeno que se assiste em todo o mundo: "a presença cada vez mais forte do Poder Judiciário sem que isso signifique numa invasão das atribuições do Poder Legislativo".

Já o vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP) avaliou que houve "demasia" por parte da CCJ da Câmara em aprovar a proposta que prevê submeter decisões do Supremo ao Congresso. "Eu acho que houve uma demasia. Na verdade, a palavra última há de ser sempre do Poder Judiciário, especialmente em matéria de constitucionalidade e mesmo em matéria da vinculação de uma determinada decisão para os tribunais inferiores", afirmou.

Sobre a decisão de Mendes de suspender a tramitação do projeto sobre partidos, o vice afirmou não caber discussão. "Eu não vou discutir porque é decisão do Supremo. Não cabe discutir", disse Temer.

O PSDB entrou nesta quinta-feira (25) com um mandado de segurança, com pedido liminar, no STF (Supremo Tribunal Federal) para suspender a tramitação do projeto que submete decisões do tribunal ao Congresso.

Editoria de Arte/Folhapress

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