Folha de S. Paulo


Ministros do STF criticam proposta para submeter decisões da Corte ao Congresso

Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) avaliaram nesta quarta-feira (24) que a proposta de submeter as decisões do tribunal ao crivo do Congresso Nacional é uma reação a recentes julgamentos que desagradaram parlamentares.

A PEC (Proposta de Emenda à Constituição), aprovada hoje pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, prevê que decisões do Supremo sobre a não validade de emendas constitucionais devem ser chanceladas pelo Congresso Nacional. O mesmo valeria para as decisões que estabeleçam uma súmula vinculante.

Comissão da Câmara aprova PEC que submete decisões do STF ao Congresso

Propõe ainda aumentar de 6 para 9 no número de votos para declarar, no STF, uma lei inconstitucional. O tribunal é composto por 11 ministros.

Para entrar em vigor, a regra aprovada hoje pela CCJ ainda precisa passar por mais uma comissão, pelo plenário da Câmara e, posteriormente, pelo Senado.

"Nós temos um sistema em que se verifica o primado do Judiciário. A última palavra não cabe ao setor político, cabe ao Judiciário, o órgão de cúpula. O guarda da Constituição é o Supremo", afirmou o ministro do STF Marco Aurélio Mello. "O que implica essa proposta é o afastamento de uma cláusula pétrea, que é a separação dos poderes da República. Não creio que para a sociedade brasileira, para o almejado avança cultural, essa submissão dos atos do Supremo seja boa, ao contrário é perniciosa."

Sergio Lima - 24.out.2012/Folhapress
Ministros do Supremo conversam durante intervalo de sessão no ano passado
Ministros do Supremo conversam durante intervalo de sessão no ano passado

O ministro também argumentou que a medida, no atual contexto, "ressoa como uma retaliação".

"Quando o Supremo vota atendendo os anseios da maioria, muito bom. Mas ele tem um histórico de decisões contra majoritárias. Não há espaços para esta mesclagem, a meu ver imprópria, que é a submissão das decisões do Supremo a um órgão político", disse.

Além disso, o ministro ironizou o aumento dos votos para a declaração de inconstitucionalidade. "Quem sabe a utopia, a unanimidade. Teríamos que ouvir o Nelson Rodrigues no que dizia que toda unanimidade é burra."

O ministro Gilmar Mendes avaliou que a proposta dificilmente será aprovada em plenário. Ele disse também que é uma discussão que "se arrasta no constitucionalismo mundial", mas que da forma proposta já está superada.

"Na nossa memória constitucional isso evoca coisas tenebrosas, nós temos precedentes na Constituição de 37 [de Getúlio Vargas], chamada polaca. Mas acabou que era o presidente da República que podia cassar decisões do Supremo e confirmar a constitucionalidade de leis declaradas inconstitucionais", disse. "Não é um bom precedente, a câmara vai acabar rejeitando isso", completou.

O ministro concorda com Marco Aurélio ao dizer que a ideia é uma reação a decisões do tribunal que desagradam.

"Pode ser qualquer questão. O aborto [de embriões anencéfalos], relações homoafetivas, temas ético, morais e religiosos. A toda hora, temos esse ônus de decidir e isso sem dúvida acaba desagradando e as vezes de forma muito ampla", disse.

O ministro Ricardo Lewandowski, por sua vez, que ocupa interinamente a presidência do tribunal, não quis polemizar.

Ele disse que os poderes são independentes e harmônicos e que, no momento certo, se for o caso, o tribunal irá tratar da questão.

Em viagem internacional, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, afirmou via assessoria de imprensa que não se pronunciaria sobre a questão.

Além dos exemplos citados por Mendes, outra polêmica Supremo e o Congresso está na perda do mandato de deputados condenados no julgamento do mensalão. A Corte decidiu pela cassação automática, enquanto parlamantares entendem que a prerrogativa de cassar os mandatos é do Legislativo.


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