Folha de S. Paulo


Visita do papa é de interesse privado e não deveria ser bancada pelo Estado, diz leitor

Está em pauta no Brasil a visita do papa Francisco. De um lado, católicos em festa. De outro, seguidores de outras religiões, e até mesmo católicos, espantados com o custo que a ilustre visita trará aos cofres brasileiros.

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Em primeiro lugar, para fins deste texto, vamos vencer o obstáculo religioso, para que sigamos em frente. Sou ateu. Fui criado em família de mãe católica e pai espírita. O texto nada tem a ver com religião, então vamos deixar esse debate de lado.

Enquete: Você acha que Francisco conseguirá recuperar o prestígio da Igreja?

Meu interesse é debater como cidadão e contribuinte.

Os jornais alardeiam que o custo da visita papal passa dos R$ 180 milhões. Que a recepção no Palácio do Planalto custará R$ 1.300 por cada convidado. Isso, fora o deslocamento de forças do Exército, que terão poder de polícia nas áreas dos eventos.

Então vamos aos pontos:

O Vaticano é um Estado. Seu território se situa dentro de Roma, mas o Vaticano não é parte da Itália. É como Mônaco, que fica encravado na França, mas não é parte dela. Por isso, quem pisa no Vaticano não está em solo italiano. O Vaticano é uma monarquia e o Papa é o equivalente ao rei.

Sendo assim, o Papa, como chefe de Estado que é, tem direito às honras que cabem a seus pares, tal como recepção de sua delegação e proteção em território brasileiro. Isso não se discute.

O problema começa quando o país anfitrião começa a gastar dinheiro com eventos que não são assuntos de Estado.

Notemos que, quando um Chefe de Estado vem ao Brasil, o faz para reunir-se com os nossos governantes, para tratar de assuntos de Estado. Exemplificando: comércio exterior, discutir tratados internacionais, travar alianças estratégicas, debater regras de imigração, parcerias e compartilhamento de tecnologia bélica e pautas similares. São assuntos de Estado e de interesse público.

O Brasil não tem comércio com o Vaticano, nem tampouco assuntos estratégicos, nem qualquer outro tema de Estado a tratar. A vinda papal ao Brasil visa tão somente a parcela da população que segue os preceitos da instituição religiosa que o pontífice representa. Portanto, o motivo de sua visita não é de interesse público, e sim privado. Ele vem tratar de religião.

Repito, minha opção pelo ateísmo não deve ser vista como motivo de implicância com a visita de Francisco que, até o momento, inclusive, me parece um líder bem-intencionado.

O problema é que não me parece correto que o Estado desembolse dinheiro público para custeio, ainda que parcial, de eventos religiosos. A megaoperação do Exército que fará a proteção nos locais onde o papa falará aos fiéis me parece descabida.

Se o evento é privado, também privada deve ser a segurança, ficando a cargo da Polícia a garantia da ordem no entorno, a orientação do tráfego, a garantia do constitucional direito de ir e vir, e a segurança dos passantes e frequentadores em via pública.

Pergunto: Se fosse um megaevento pentecostal, da Igreja Universal, por exemplo, será que tal dispêndio de dinheiro, uso de homens e equipamentos públicos seria tolerado? Não creio.

Você, católico, toleraria?

Que o papa tem direito a vir, ser recebido pela nossa chefe de Estado (e de governo), é indiscutível. Que tem direito às honras, idem. Mas quanto a assuntos de interesse privado, quem deve arcar com a totalidade dos gastos, inclusive com a segurança do pontífice e dos frequentadores, é a instituição que ele representa e que organiza o evento.

Porque, além da inconstitucionalidade da participação nos gastos com tais eventos, ainda precisaríamos nos preocupar com o princípio da isonomia. Ou seja, se qualquer outra religião resolver promover megaeventos no nosso país, teremos que suportar os mesmos tipos de gastos, oferecendo recursos públicos para arcar com despesas que deveriam ser desembolsadas pelos organizadores.

Resumindo, basta separar a visita de um chefe de Estado da parte que esse mesmo chefe atuará apenas como líder de uma instituição privada.

Aliás, se o governo for participar com recursos financeiros e com deslocamento de tropas do exército para segurança de eventos privados, fica aqui o minha sugestão de que o mesmo se faça quando houver megafestivais de rock e shows do U2.

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