Folha de S. Paulo


ROBERTO LUIS TROSTER

O governo precisa injetar mais recursos na Caixa Econômica Federal? NÃO

Samuel Costa - 26.mai.2015/Folhapress
S?O PAULO, SP, BRASIL, 26-05-2015:Agencia da Caixa Economica federal, situada na rua Palmeiras, n238. (Foto: Samuel Costa/Folhapress REVISTA SP) ***EXCLUSIVO FOLHA****
Agência da Caixa Econômica Federal no centro de São Paulo

PROBLEMA NÃO É DE CAIXA NA CAIXA

Os balanços da Caixa Econômica Federal (CEF) mostram sua carteira de crédito crescendo, e o índice de Basileia, que mede a capacidade de emprestar de um banco, em 15%, bem acima do mínimo exigido pela regulamentação.

Só necessitaria de uma capitalização caso fosse decidida uma aceleração forte na oferta de financiamentos. Entretanto, para que haja um crescimento sem sobressaltos, o que falta é uma política para os bancos oficiais e um modelo de negócios atualizado.

A CEF foi fundada como Caixa Econômica da Corte em janeiro de 1861, há exatos 157 anos, pelo imperador dom Pedro 2º, com a missão de atender as camadas mais pobres, incentivando a poupança e oferecendo empréstimos a taxas mais baixas que as outras instituições.

A Caixa mantém o foco original, gerenciando programas como o Bolsa Família, o FGTS e o Minha Casa Minha Vida, com um atendimento de qualidade, mas apresenta distorções que deveriam ser corrigidas. A causa básica é o uso político dos bancos oficiais. As idas e vindas nas diretrizes de suas gestões a tornam vulnerável aos humores de Brasília.

Ilustrando o ponto, a indicação de alguns vice-presidentes sem experiência bancária para sua diretoria é um exemplo. Outro é o crescimento maior do crédito dos bancos oficiais em anos eleitorais —foi assim em 2010 e em 2014.

Acelerações bruscas na oferta de financiamentos no curto prazo fragilizam os balanços no médio prazo. É inequívoca a necessidade de diretrizes básicas para nortear a atuação dessas instituições.

Nossos bancos estatais são comparativamente melhores do que alguns de seus congêneres de outros países e apresentam um padrão de qualidade de serviços tão bom quanto os demais em alguns segmentos do mercado financeiro brasileiro. Entretanto apresentam distorções, tais como taxas exageradamente elevadas em algumas linhas de financiamentos.

A participação do governo por meio do sistema financeiro para corrigir certas distorções do sistema de mercado é meritória. Todavia, essa atuação precisa ser bem analisada, usar como canais todas as instituições, inclusive as privadas, e ser bem dimensionada.

Considerando que os bancos oficiais desempenham dois papéis —um de banco comercial e outro de banco de fomento—, deve-se tornar mais transparente sua atuação em cada uma das funções, com mais informações sobre beneficiários, custos e impactos na economia.

Além da necessidade de blindar as instituições oficiais de pressões eleitorais, mudanças na tecnologia, na concorrência, na demografia, na cultura e na estrutura econômica impõem a necessidade da definição de uma política para o setor. Deve-se pensar estrategicamente em medidas como a abertura de capital da Caixa, e sua fusão com o Banco do Brasil deveria ser analisada.

A elaboração de uma política para o setor deve também avaliar a conveniência da manutenção de alguns privilégios concedidos aos bancos oficiais, como o gerenciamento de algumas linhas de financiamento, a administração de alguns programas de governo e o acesso a alguns fundos subsidiados.

Deve-se analisar o custo-benefício dessas vantagens e da oportunidade de serem alocados também a bancos privados. Deve prevalecer o que for melhor para o país.

A Caixa necessita desenvolver um modelo de negócios rentável, estável e sólido, com uma contribuição social legitimada. Não precisa de capitalização nem de mudar a missão dada por dom Pedro 2º.

ROBERTO LUIS TROSTER, doutor em economia e consultor, foi economista-chefe da Febraban (Federação Brasileira de Bancos) e professor da USP

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