Folha de S. Paulo


ALEXANDRE BORGES

A nova Lei de Migração traz riscos ao Brasil? SIM

Cris Faga/Fox Press Photo/Folhapress
SAO PAULO SP, SP 16/05/2017 PROTESTO SP: Movimento denominado
Protesto contra a nova Lei de Migração, em São Paulo

LIBERDADE AINDA QUE TARDIA

O Brasil decidiu atualizar seu antiquado Estatuto do Estrangeiro com um entendimento pouco iluminado sobre o que está na essência de uma política inteligente e responsável de migração.

A promulgação da nova lei gerou até um relatório crítico e ponderado do TCU (Tribunal de Contas da União) que merece atenção de todos os envolvidos. Em vez de modernizar o país para a atração de estrangeiros de forma sustentável, decidimos pular etapas civilizacionais e prometer o que não cumprimos nem sequer para nós mesmos.

Na semana passada, o ministro do do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello concedeu liminar a um camaronês condenado por tráfico de drogas usando a nova Lei de Migração.

Após ser sentenciado para extradição em 2010, o traficante teve um filho no Brasil e, segundo o ministro, não deve mais ser deportado. Não é exatamente um começo auspicioso para a aplicação da lei no mundo real, longe das palavras de ordem e das abstrações estatísticas.

Malabaristas intelectuais costumam torcer dados até que confessem que todo fluxo migratório é positivo, desconsiderando o momento histórico, além do cenário social e econômico local em cada caso. Imigrantes costumam formar um contingente vibrante e dinâmico de indivíduos criativos e energéticos que sonham com uma nova vida com mais oportunidades, mas é isso que oferecemos fora dos discursos e das alegadas boas intenções?

O Brasil pode desfalcar vizinhos —muitos precisando desesperadamente de desenvolvimento e crescimento— de alguns de seus cidadãos com maior potencial para dar a eles em troca recessão, desemprego, 60 mil assassinatos por ano e serviços públicos subsaarianos. Esses estrangeiros, é preciso que se diga, estão sendo enganados. É imoral e injustificável.

Há uma pressão quase insuportável de lobistas e despachantes de corporações transnacionais pela facilitação indiscriminada da importação de mão de obra barata em diversos países ocidentais, jogando para baixo salários e a qualidade de vida dos trabalhadores locais, que são forçados repentinamente a disputar empregos com multidões de novos cidadãos.

Os riscos sociais, porém, não parecem tirar o sono de ninguém em Davos ou Bruxelas. Tanta insensibilidade pode ter efeitos colaterais nefastos.

A Estátua da Liberdade é o cartão postal da nação que mais recebeu e deu oportunidades a imigrantes na história. Em seu pedestal, a bela e inspiradora inscrição de Emma Lazarus (1849-1887): "Venham a mim as multidões exaustas, pobres e confusas ansiosas pela liberdade. Venham a mim os desabrigados, os que estão sob a tempestade (...) Eu vos guio com a minha tocha."

Em tempos de ideologização radical de tudo, é preciso relembrar e reforçar os valores originais dessa promessa que ainda atrai milhões para a "terra dos livres, lar dos bravos". A América do séc. 19 não era um paraíso de "direitos" e programas assistencialistas, mas uma terra de oportunidades para quem queria trabalhar duro, empreender e vencer. Os resultados falam por si.

A estonteante imagem da deusa grega de quase cem metros de altura rompendo as correntes da escravidão e da opressão empunhando a tocha da liberdade estará para sempre gravada na memória de todos que abraçaram o sonho americano pela porta de entrada de Nova York. Mesmo ilhada, a liberdade sempre será a "luz do mundo" e destino preferencial dos imigrantes.

Por aqui, o desafio do Brasil continua o mesmo: mais liberdade, empreendedorismo, produtividade e inovação para brasileiros e estrangeiros. Se a atual discussão ajudar a iluminar tais questões, é bem vinda. Mesmo com séculos de atraso.

ALEXANDRE BORGES, 47, é publicitário, analista político e diretor do Instituto Liberal

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