Folha de S. Paulo


editorial

Futuro do pretérito

Folhapress - Igo Estrela/PMDB Nacional
LOCAL E DATA DESCONHECIDA: Ingretantes do MDB (Movimento Democrático Brasileiro). (Foto: Folhapress) Convenção Nacional do PMDB. Presidente da República Senhor Michel Temer. Foto: Igo Estrela/PMDB Nacional
Convenção do MDB

Em 27 de outubro de 1965, o regime militar que se consolidava depois do golpe de 1964 editou o Ato Institucional número 2, pelo qual as eleições para o Executivo federal passavam a ser indiretas.

O decreto também impunha um sistema bipartidário, que viria a ser preenchido por Arena e MDB. A primeira, a Aliança Renovadora Nacional, congregava os apoiadores da ditadura e costumava contar com a providencial ajuda dos casuísmos autoritários.

Por sua vez, o Movimento Democrático Brasileiro abrigava as forças de oposição, desfalcadas de um leque de líderes que tiveram direitos políticos cassados.

Reunindo políticos do centro à esquerda, o MDB nasceu como uma espécie de frente, que nem sempre conseguia manter-se unida, apesar do inimigo comum.

Com o declínio do ciclo militar, a sigla, em sua multiplicidade de vertentes, cresceu, obteve resultados eleitorais expressivos e transformou-se no PMDB em 1980, com a volta do pluripartidarismo.

Simbolizado pela figura histórica de Ulysses Guimarães, a agremiação chegou ao Planalto por vias indiretas e tortuosas, em decorrência da morte de Tancredo Neves e da adesão de um antigo líder do partido da ditadura, José Sarney.

Desde então, o PMDB especializou-se em representar oligarquias e barganhar posições como linha auxiliar do governo federal, fosse qual fosse o partido no poder.

Agora, no intuito reconquistar a confiança que as instituições partidárias perderam aos olhos dos brasileiros, a agremiação do presidente Michel Temer optou pelo artifício de retirar a palavra "partido" da sigla e voltar a se chamar MDB.

A maquiagem veio acompanhada de palavrório pomposo acerca de compromissos éticos e critérios de "compliance" (conformidade com normas), um estrangeirismo em voga pós-Lava Jato.

Seria preciso um grau desumano de credulidade para acreditar que o PMDB —ou melhor, o MDB deixará de ser o condomínio político e fisiológico em que se transformou ao longo de sua história para ressurgir como um paladino da ética e da modernidade.

Deve-se reconhecer a relevância das reformas propostas e aprovadas sob Temer. Mas nada, muito menos o núcleo central do governo, faz crer que o partido caminhe para se livrar das práticas viciadas com as quais tem sobrevivido.

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