Folha de S. Paulo


Caio Megale

Desengessar é preciso

Em editorial nesta segunda (11/9), "Prefeitura Engessada", a Folha toca em ponto fundamental da gestão fiscal do setor público, a rigidez orçamentária.

Questões legais, como o piso de gastos em algumas áreas, reduzem a margem para corte. O deficit da Previdência é crescente, e a capacidade de ajuste na folha, por conta da estabilidade do servidor público no emprego, é muito limitada. Esse quadro se torna mais dramático com a queda nas receitas, resultado da recessão econômica.

No caso da Prefeitura de São Paulo, a rigidez vai além das questões legais. As despesas com saúde e educação, somadas, superam em mais de nove pontos percentuais os pisos legais, por conta de reajustes acima da inflação em convênios e salários nos últimos anos.

O mesmo aconteceu em contratos de prestação de serviços que não possuem piso legal, mas são essenciais, como varrição de ruas e coleta de lixo. Isso porque, no passado recente, pouco se fez para aumentar o controle e a eficiência dessas despesas.

Na Previdência municipal, os aportes do Tesouro triplicaram desde 2012. Um projeto tímido de reforma foi enviado à Câmara ao final da gestão passada, sem grande convicção do Executivo.

Completa o quadro a concessão pouco criteriosa de benefícios. O subsídio ao transporte público, por exemplo, subiu de R$ 1 bilhão, em 2012, para R$ 2,9 bilhões, em 2016.

A falta de planejamento era evidente: o orçamento de 2016 previa R$ 1,7 bilhão, uma diferença de R$ 1,2 bilhão para o efetivamente realizado. Quase R$ 400 milhões dessa diferença não foram pagos, ficando o ônus para a atual gestão.

É comum atribuir o problema ao congelamento da tarifa cheia neste ano. Não é verdade.

Tal medida foi compensada pelo aumento de outras tarifas (como as de integração), pela limitação recente do passe livre (benefício em que havia distorções) e por esforços para redução de fraudes. O buraco orçamentário em 2017 será o mesmo de 2016, produzido na gestão passada.

Estamos focados em atacar o problema da rigidez orçamentária. As secretarias têm trabalhado para aumentar a eficiência do gasto em serviços essenciais.

Estudamos alternativas para equacionar a Previdência por meio de uma reforma estrutural que a torne saudável e justa. A secretaria de Transportes prepara edital para a licitação do transporte público, abrindo espaço para reduzir o subsídio.

Revisamos contratos, obtendo uma economia aproximada de R$ 360 milhões. Reduzimos cargos em comissão em 31%, readequamos programas ineficientes, repensamos prioridades e estamos racionalizando os gastos administrativos.

O resultado tem sido positivo. Os gastos totais da prefeitura cresceram apenas 0,8% até agosto, gerando uma economia em custeio estimada em R$ 700 milhões para este ano. Do lado da receita, intensificamos a fiscalização, criamos a Nota do Milhão e lançamos o programa de parcelamento incentivado de dívida, incrementando a arrecadação em quase R$ 1 bilhão.

Para a retomada mais rápida do investimento, o programa de desestatização será fundamental. Poderá arrecadar mais de R$ 5 bilhões nos próximos anos, além de cortar em quase R$ 500 milhões o custeio.

Como não se espera uma retomada intensa da economia brasileira (e, portanto, da arrecadação), a desmobilização de ativos será a forma de acelerarmos o investimento em setores com alto impacto social, como pede o editorial da Folha.

O esforço está apenas começando. É preciso perseverança para reverter práticas sedimentadas há décadas, que comprometeram os controles e a eficiência do gasto público. Não se gasta pouco; gasta-se mal.

Se não formos capazes de alterar essa tendência perversa, subsídios, convênios e Previdência ocuparão gradualmente todo o espaço orçamentário da prefeitura, levando a cidade a uma inviabilidade danosa às próximas gerações.

CAIO MEGALE é economista e secretário municipal da Fazenda da Prefeitura de São Paulo

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