Folha de S. Paulo


editorial

Flerte racista

Jonathan Ernst - 14.ago.2017/Reuters
U.S. President Donald Trump pauses during a statement on the deadly protests in Charlottesville, at the White House in Washington, U.S., August 14, 2017. REUTERS/Jonathan Ernst TPX IMAGES OF THE DAY ORG XMIT: WAS956
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump

Donald Trump ostenta as maiores taxas de rejeição a um presidente dos EUA nos primeiros meses de mandato desde que esse tipo de levantamento começou a ser feito, nos anos 1940 –e o republicano parece fazer o que pode para desgastar ainda mais sua imagem.

Considerando a média das pesquisas, sua gestão era desaprovada por 55,6% dos americanos na segunda-feira (21). Apenas 37,7% viam o governo sob lentes positivas.

O quadro desconfortável açula as piores características do mandatário. Como reconquistar a maioria parece cada vez mais improvável, resta agradar a eleitores e militantes mais devotados.

Esses estratos fiéis ao presidente, como se sabe, defendem ideias conservadoras extremadas, no limite do racismo, no campo social, e da inoperância, no econômico.

A relação delicada com o eleitorado ajuda a explicar os vaivéns do presidente no episódio de Charlottesville (Virgínia). Seu primeiro impulso foi o de não condenar com veemência os grupos racistas que organizaram um protesto no qual uma mulher foi morta.

Vendo a reação tíbia provocar intenso descontentamento, a Casa Branca decidiu emitir um comunicado mais enérgico contra os "supremacistas brancos".

Um dia depois, porém, Trump, possivelmente cedendo a pressões de seus apoiadores, afirmou que movimentos antirracismo tinham tanta responsabilidade pela violência em Charlottesville quanto os extremistas de direita.

Desde a Segunda Guerra, nenhum presidente norte-americano havia flertado tão às claras com posições radicais embebidas em preconceito. A América "mainstream" acusou o golpe.

Empresários que eram simpáticos a Trump renunciaram a posições que ocupavam em conselhos; comandantes militares divulgaram notas em repúdio ao racismo; republicanos fizeram declarações contrárias à postura do chefe de governo.

Em meio a essa balbúrdia, anunciou-se a demissão de Steve Bannon —o estrategista-chefe que ajudou a levar Trump à Casa Branca era a face mais visível da extrema direita em seu governo. O fato foi interpretado, numa visão mais otimista, como um ponto de inflexão. Imagina-se que, sem Bannon, o presidente terá atuação mais moderada.

Embora seja uma interpretação possível, não há por ora nenhum indício a comprová-la. Em algumas questões, como a da Coreia do Norte, Bannon mostrava-se mais razoável que seu chefe.

O despreparo evidente de Trump para o cargo pode, na melhor das hipóteses, ser atenuado pela experiência. De imediato, o quadro político não contribui para uma atuação menos desastrada.

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