Folha de S. Paulo


editorial

Democracia à iraniana

Enquanto em muitas nações do mundo islâmico as eleições são jogos de cartas marcadas, em geral a reboque do ditador da ocasião, no Irã os pleitos tendem a ser competitivos e sem fraudes —a reeleição de Mahmoud Ahmadinejad em 2009 parece ter sido a exceção.

Nesta sexta-feira (19), os iranianos irão às urnas escolher seu próximo presidente. O favorito é o reformista Hasan Rowhani, que tenta a reeleição. Seu maior oponente é o conservador Ebrahim Raisi.

A aparente probidade do processo está longe de fazer do Irã uma democracia plena. Só participam do sufrágio candidatos chancelados pelo Conselho dos Guardiães, um corpo de 12 especialistas em lei islâmica ligado ao aiatolá Ali Khamenei, o líder supremo do país.

Nesta eleição, o conselho vetou 1.630 postulantes, incluindo todas as 137 mulheres que arriscaram uma candidatura.

Embora não possa contrariar abertamente o aiatolá, o candidato eleito possui certa margem de manobra. O próprio Rowhani conseguiu negociar um acordo nuclear com o Ocidente, ao qual Khamenei se mostrara crítico em mais de uma ocasião.

Considerada a restrita latitude para divergências, são nítidas as diferenças de visões entre os dois principais candidatos. O presidente defende a ampliação das liberdades individuais e a abertura do país para o mundo; Raisi prega a autossuficiência como caminho para superar as dificuldades econômicas.

Rowhani conta com o apoio dos jovens e da população urbana, enquanto seu oponente é mais forte no interior e entre os mais religiosos. Khamenei não chegou a apoiar Raisi explicitamente, mas deixou claro que ele tem sua simpatia.

A economia, como sempre, será um fator decisivo. Quando Rowhani assumiu o governo, em 2013, sanções internacionais haviam posto o país em forte recessão, com inflação na casa dos 35%.

Com o acordo nuclear, que levou à retirada das restrições determinadas pela ONU, o país voltou a vender petróleo nos mercados legais. A economia cresceu 6,5% em 2016, e a inflação caiu para um dígito.

Apesar dos bons indicadores, pesa contra o presidente a crescente frustração dos iranianos, uma vez que as melhorias ficaram em grande parte restritas ao setor petrolífero, do qual grandes contingentes populacionais estão excluídos.

O maior risco para Rowhani —e para os interesses do Ocidente— é um segundo turno no qual teria contra si a união de todas as forças conservadoras do país.

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