Folha de S. Paulo


editorial

Nova normalidade

Com quase uma centena de investigados, entre ministros (8), senadores (24), governadores (3), deputados federais (39) e outros nomes de alta plana da política brasileira, a relação divulgada pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, parece justificar as sensações apocalípticas de que foi cercada na opinião pública.

Se qualificá-la de "lista do fim do mundo" parece adequado, do ponto de vista subjetivo, há entretanto a considerar que representa apenas mais um passo, não decisivo, num processo de desgaste que já vem de um bom tempo e que demorará ainda mais para conhecer seu fim.

Outras listas, com nomes também de peso, já vieram a público. Em 2015, o procurador-geral, Rodrigo Janot, pedia a abertura de inquérito no STF contra 47 políticos, dos quais até agora apenas 6 se tornaram réus, sem que nenhuma condenação se tenha efetivado.

A atual relação de nomes provém de outro pedido da Procuradoria-Geral da República, baseado em delações premiadas —cujo teor já vinha sendo oficiosamente posto a público— de executivos ligados à construtora Odebrecht.

Que se determinem investigações sobre os citados é a consequência natural desses depoimentos. Se a veracidade do que disseram os executivos é condição para os benefícios penais que pleiteiam, não seria possível desconsiderar as acusações que dirigem a tantos políticos.

São de diversa gravidade, aliás. Enquanto o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab (PSD), é inquinado do recebimento de R$ 20 milhões entre 2008 e 2014, seu colega de partido, o deputado potiguar Fábio Faria, é citado como beneficiário de um "pixuleco", vá lá o termo, de R$ 100 mil.

Contra alguns políticos conhecidos, como o ministro da Cultura, Roberto Freire (PPS), ou as senadoras Kátia Abreu (PMDB-TO) e Vanessa Grazziotin (PC do B-AM), consta o recebimento de verbas pelo sistema do caixa dois, sem que, entretanto, se identifique em troca de que favores específicos tal financiamento se justificasse.

Em outro patamar estão as suspeitas de corrupção passiva —cuja apuração será muito mais complexa— que pesam sobre figuras de peso como os ministros Moreira Franco (Secretaria-Geral) e Eliseu Padilha (Casa Civil), por favorecimentos à Odebrecht em licitações.

A amplitude de nomes e forças políticas atingidas desacredita em definitivo teorias quanto a vieses partidários da Lava Jato. No PSDB, até então relativamente poupado, expoentes como José Serra, Aloysio Nunes, Aécio Neves e Antonio Anastasia são citados —e mesmo, de passagem, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Haverá muito a investigar antes de qualquer condenação, ou absolvição, definitiva. Como aconteceu em revelações anteriores, o país e a política prosseguem suas atividades, numa espécie de nova normalidade: a normalidade do escândalo generalizado.

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