Folha de S. Paulo


Felipe Scudeler Salto e Gabriel Leal de Barros

Idade mínima de 65 anos é adequada para aposentadoria? SIM

NÃO HÁ REFORMA SEM LIMITE PARA IDADE

A proposta de reforma da Previdência enviada ao Congresso modifica a Constituição para aproximar o Brasil do resto do mundo.

Ao contrário do que afirmam os críticos, ou as regras de acesso ao benefício mudam ou não haverá regime capaz de financiar as aposentadorias de nossos filhos e netos. A fixação da idade mínima é o coração dessa agenda.

O Legislativo já iniciou o debate sobre possíveis flexibilizações no texto original do projeto, o que é democrático. No entanto, há algo essencial que precisa ser preservado para que a aprovação da reforma se traduza em benefícios para a toda a população.

Trata-se da busca de um equilíbrio intertemporal entre as receitas e os gastos previstos para as próximas décadas. Essa matemática depende da evolução da população de idosos e da capacidade do país de dinamizar sua economia e voltar a crescer.

O Brasil envelheceu e esse processo vai se acelerar muito nas próximas décadas. Até 2025, a atual população de idosos deverá crescer 50% e, até 2050, será por 2,5 vezes maior que a atual. Impossível imaginar que, com as regras atuais, seremos capazes de manter pagamentos dignos de aposentadoria para todos os brasileiros.

O Brasil de 30 anos atrás não existe mais: um país jovem, com 10 idosos para cada 100 trabalhadores ativos. Hoje, já são 12 idosos para cada 100 trabalhadores e, em 2060, serão 45 para cada 100.

Isto é, haverá relativamente muito mais idosos, mas menos recursos para pagar suas aposentadorias. Sem mudanças, os benefícios previdenciários superariam 70% do orçamento público já em 2030.

O Brasil gasta cerca de 12% do PIB com aposentadorias, incluindo os pagamentos aos trabalhadores da iniciativa privada e do serviço público. São R$ 740 bilhões. Para que se tenha ideia, trata-se de montante equivalente a mais de 11 vezes o orçamento de investimentos do governo federal.

O projeto fixa uma idade mínima igual para homens e mulheres: 65 anos. O objetivo é reduzir o fluxo de novas e precoces aposentadorias, incentivando trabalhadores com plenas condições laborais a permanecerem na ativa. Para ter claro: hoje a idade média de aposentadoria por tempo de contribuição é 55 anos. A expectativa de vida de um indivíduo com essa idade é 81 anos.

Há quem diga que a idade mínima atingiria desproporcionalmente os mais pobres. É um erro básico, que pode ser desfeito rapidamente com uma simples consulta aos dados.

Os mais pobres já se aposentam aos 65 anos, uma vez que têm mais dificuldade em acumular o requerido tempo de contribuição, pois oscilam entre períodos de trabalho formal e informal.

A nova regra, por conseguinte, atingirá especialmente os trabalhadores das classes média e média alta. É cristalino, portanto, que manter o atual sistema ou mesmo perpetuar quaisquer vantagens para os grupos mais educados, de maior renda e inserção no mercado de trabalho, seria o avesso do avesso do avesso. Há insustentabilidade matemática nas regras vigentes.

A idade mínima é consensual na literatura sobre o tema e é, na prática, observada na maior parte dos países. Adotar essa diretriz ajudará o Brasil a ter um sistema previdenciário sustentável e contas públicas saudáveis, condições essenciais para o crescimento econômico.

A questão da desigualdade social poderá ser mais bem atendida, já que sobrarão mais recursos para financiar programas de transferência de renda focalizados. Esse é o futuro, e o futuro chegou.

FELIPE SCUDELER SALTO, economista, mestre em administração pública pela Fundação Getulio Vargas, é diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI)

GABRIEL LEAL DE BARROS, economista e especialista em contas públicas, é analista da IFI

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