Folha de S. Paulo


Carlos A. C. Lemos

Pobre Copan

Faço por meio deste texto um desabafo acerca da "burrocracia" municipal apresentada diante do pedido de troca de pastilhas de revestimento do edifício Copan, efetuado em março deste ano.

Essa icônica construção no centro de São Paulo está agora com suas pastilhas se despregando e a cair, o que acarreta acidentes variados, até quebrando para-brisas de automóveis.

O que ocorre é resultado de quase 60 anos de exposição à insolação seguida de intempéries; é um desgaste fatal da construção.

A troca do revestimento da edificação é emergencial, não pode ser postergada pelos andamentos burocráticos e exigências absurdas do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) e do Conpresp, responsáveis pela salvaguarda municipal de bens preservados pela sua importância arquitetônica e histórica na cidade de São Paulo.

Neste episódio, ocorre um lamentável procedimento da municipalidade. Por conta da Lei Cidade Limpa, veda-se ao Copan a possibilidade de angariar recursos suplementares por meio de anúncios publicitários na gigantesca tela de proteção já instalada.

A troca de milhares de metros quadrados de pastilhas vai custar uma enormidade de reais e, além disso, tem que ser levada em conta a transitoriedade do anúncio.

E que "Cidade Limpa" é esta? Temos uma das cidades mais lambrecadas do mundo, com grafiteiros e pichadores totalmente "despoliciados" quanto à localização e qualidade de seus trabalhos.

As construções significativas do nosso patrimônio material, no momento de sua eleição à salvaguarda definitiva, podem estar ainda mantendo sua integridade original ou apresentar alterações decorrentes de mudanças em seus programas primeiros de ocupação.

E ainda podem existir casos ditos de requalificações, isto é, alterações obrigatórias consequentes de mudanças de uso a posteriori ao tombamento, como a antiga administração da Estação da Luz, que foi transformada na sede do Museu da Língua Portuguesa.

Finalmente, existem os trabalhos de manutenção, obras de conservação alheias a qualquer desejo de alteração formal. É o caso desta mencionada troca de pastilhas do Copan.

DPH e Conpresp, em suas exigências ao condomínio para aprovação da referida substituição de pastilhas, abusam ao querer que sejam concomitantemente apresentados desenhos e projetos relativos às mudanças provenientes de intervenções ocorridas ao longo do tempo na fachada posterior do Copan.

Neste meio século de ocupação do edifício, grande parte dos 1.116 condôminos fez modificações em suas unidades e elas são definitivas na hora do tombamento, que não tem nenhum efeito retroativo. Estão lá e pronto.

Meu espanto e desabafo decorrem da arbitrariedade dessa imposição, já que não há o que exigir de cada um dos antigos moradores; alguns nem vivem mais lá. A aparência original daquela fachada está hoje
comprometida com novos caixilhos e alterações nos elementos vazados, os ditos cobogós.

O que ocorre agora não passa de abuso de autoridade extemporâneo, passível de gerar demandas judiciais intermináveis na Justiça. A troca de pastilhas do Copan não pode esperar o andamento desse despautério.

CARLOS ALBERTO CERQUEIRA LEMOS, arquiteto, é professor aposentado de pós-graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP

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