Folha de S. Paulo


Marcio Serôa de Araújo Coriolano

A urgência de uma nova visão regulatória

Diante da atual conjuntura socioeconômica do país, urge que seja inserido na agenda legislativa um tema de fundamental importância: a instituição de uma política de gestão pública que implante, de fato, um programa de Análise de Impacto Regulatório (AIR) nas operações dos órgãos federais reguladores.

Enquanto os países que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), como Estados Unidos, Inglaterra e Canadá, já evoluíram muito nesse sentido, o Brasil ainda convive com um modelo em que o Estado assume papel regulador, com conduta que eleva custos e ônus impostos às empresas, às instituições e aos cidadãos.

A OCDE classifica a AIR como uma ferramenta que propicia um caminho de avaliações críticas importantes para se tomar decisões sobre o conteúdo e a forma de regular mercados.

Nos países da OCDE, o processo inclui a análise da relação custo-benefício e dos impactos na concorrência, no emprego, na inovação e na produtividade. No mercado de saúde canadense, diante do estudo de uma proposta considerada polêmica, há, inclusive, a possibilidade de a agência reguladora contratar entidade externa independente para testar o impacto nos negócios.

No Brasil, o tema tem sido objeto de estudos e pesquisas acadêmicas e, irregularmente, gera ações de ordem prática por parte de agências reguladoras. Mas tudo é ainda incipiente diante da urgência de debater, com profundidade, a alteração do curso de elaboração de comandos normativos.

Para o bem da sociedade brasileira, isso deveria ocorrer em todos os setores econômicos, especialmente em mercados regulados. Um programa efetivo de análise de impacto regulatório facilitaria muito as relações governamentais e de compliance no país.

A implantação de uma política lastreada no desenvolvimento de estudos de impactos normativos está intrinsecamente ligada ao fortalecimento das agências reguladoras. Ao analisarmos o setor de seguros, é plausível afirmar que estamos diante do mercado mais regulado pelos governos do mundo inteiro.

Cenário esse relacionado à natureza do negócio: a responsabilidade de formar poupanças que amparem as garantias assumidas para a proteção de pessoas e patrimônios.

Mas, mesmo sendo responsável por um volume da ordem de R$ 800 bilhões anuais, a regulação do setor é realizada por uma autarquia federal, a Superintendência de Seguros Privados (Susep), com atuação circunscrita às frentes de fiscalização e supervisão.

Isso demonstra que medir os impactos dos normativos é um movimento diretamente ligado ao fortalecimento dos entes supervisores, os quais deveriam ter plenos poderes para interagir com as empresas reguladas.

Em casos como o do setor segurador, é urgente não somente transmutar a autoridade de mercado em uma legítima agência reguladora como criar um modelo nos padrões internacionais. O mesmo deveria ser aplicado à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Não há dúvida de que temos um longo caminho a percorrer rumo a um novo contexto regulatório. Isso dependerá da vontade política em trilhar as estradas já percorridas pelos países desenvolvidos.

Ao avançarmos nessa direção, abriremos mais canais de diálogo entre o Poder Público, as empresas e a sociedade em geral. Na prática, devemos trabalhar, arduamente, para produzir menos normativos que geram ônus e desequilíbrios econômicos e sociais.

É preciso enxergar que uma atuação mais enérgica nesse campo auxiliará a retomar o ciclo de crescimento sustentado do país.

MARCIO SERÔA DE ARAÚJO CORIOLANO, economista, é presidente da Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNseg)

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