Folha de S. Paulo


JOSÉ HORÁCIO HALFELD REZENDE RIBEIRO

Brasil à espera da redenção

O processo de impeachment tornou-se uma guerra com duras acusações de crimes e golpes, o que revela as mazelas dos Poderes da República. Perdeu-se o verdadeiro sentido de espírito público, e diversos atores querem apenas vencer ou se aproveitar das oportunidades que surgem com a crise.

Assim foi, e assim será. Uma desanimadora realidade que nos leva a concluir que onde está o poder, está a corrupção, que onde está o Estado, está a ineficiência.

"Ubi homo ibi societas. Ubi societas, ibi jus." Onde está o homem, está a sociedade; onde está a sociedade, está o direito. Esse princípio, enunciado pelo jurisconsulto romano Ulpiano (150-223), é um dos primeiros ensinados nas faculdades.

O direito nunca foi instrumento da injustiça. Ao contrário. Todavia, tal como uma maldição, a corrupção nos acompanha há muito tempo.

O primeiro ouvidor-mor do Brasil, o desembargador Pero Borges, ex-corregedor de Justiça no Algarve, não tinha ficha limpa. Quando exerceu o cargo de corregedor de Justiça em Elvas, no Alentejo, Borges era o encarregado de supervisionar a construção de um aqueduto.

O dinheiro acabou antes que a obra ficasse pronta, e uma investigação apontou que Borges "recebia indevidamente quantias de dinheiro que lhe eram levadas a casa, provenientes das obras do aqueduto".

Foi condenado a devolver o dinheiro extraviado e ficou suspenso por três anos do exercício de cargos públicos. No entanto, um ano e sete meses após a sentença, foi nomeado ouvidor-geral do Brasil.

Novas perspectivas tivemos quando o presidente interino, Michel Temer, afirmou em seu primeiro pronunciamento após assumir o cargo: "A moral pública será permanentemente buscada".

Repetiu o que se espera de um homem das letras jurídicas. Convém lembrar a advertência de Ulysses Guimarães quando da promulgação da Constituição Federal de 1988: "A vida pública brasileira será também fiscalizada pelos cidadãos. Do presidente da República ao prefeito, do senador ao vereador. A moral é o cerne da pátria. A corrupção é o cupim da República. Não roubar, não deixar roubar, pôr na cadeia quem roube, eis o primeiro mandamento da moral pública".

Desde a Constituição de 1988, período que se seguiu ao fim da ditadura militar, um advogado não ocupava a Presidência da República. Esse fato é repleto de simbolismo, num momento em que o Brasil necessita reencontrar seu caminho.

A perspectiva do governo Temer é de ordem para retomarmos o progresso. O Brasil tem um novo interlocutor, sempre atento ao texto constitucional, que nos transmite segurança por saber que é fundamental o pacto com a sociedade e a classe política.

As palavras do presidente interino são bem medidas, equilibradas e serenas. Palavras de quem sabe que somente com diálogo e trabalho é possível construir a solução para os entraves do país.

Os problemas são muitos e antigos na educação, saúde, previdência e carga tributária, agravados por uma administração pública ineficiente, cara e corrupta. O discurso do novo governo é claro nas premissas de respeito à moral pública e à eficiência da democracia.

necessária e fundamental revisão do pacto federativo também não foi ignorada nas propostas do jurista Michel Temer.

De toda sorte, aprovado e concluído o processo de impeachment, todos os caminhos terão o mesmo destino: cumprir e fazer cumprir as leis é o que deseja um nação à espera da redenção.

JOSÉ HORÁCIO HALFELD REZENDE RIBEIRO é é presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo e do Colégio de Presidentes dos Institutos dos Advogados do Brasil

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