Folha de S. Paulo


editorial

Hora da inverdade

Começou mal a campanha eleitoral, sob o signo da inverdade. Se o objetivo era dar a conhecer melhor os candidatos a prefeito de São Paulo, o primeiro debate na TV Bandeirantes, como sempre engessado por uma miríade de regras, serviu para mostrar que eles não têm respeito pelo público.

Tome-se a ausência de debatedores como Luiza Erundina (PSOL) e Ricardo Young (Rede). O líder na pesquisa Datafolha, Celso Russomanno (PRB, com 25% de intenção de voto), chegou a ensaiar uma defecção, em suposta solidariedade com a ex-prefeita (que tem 10%); compareceu, ao final, com o sorriso de sempre pregado na cara.

Afeito a platitudes, o candidato prometeu baixar impostos sem explicar como equilibraria o caixa da prefeitura nestes tempos de arrecadação em queda. Soou tão sincero quanto Marta Suplicy (PMDB) ao se dizer arrependida de ter criado taxas quando governou a cidade.

Marta, João Doria (PSDB) e Major Olimpio (SDD), artífices do veto a Erundina no evento, centraram fogo em Fernando Haddad (PT) e deixaram Russomanno ileso (adversário que decerto reputam mais débil num segundo turno).

Seu objetivo era ligar o atual prefeito aos escândalos do PT no Planalto, ao que o ex-ministro de Lula e Dilma respondeu com o argumento de que toda organização tem maus elementos –enfim uma verdade, ainda que escapista.

Haddad engalfinhou-se com Doria e outros numa algaravia de números de saúde, educação e segurança. De tão díspares, só serviram para demonstrar que nenhum tem apreço pela veracidade dos fatos.

Doria deu prova disso ao sustentar que não defendera extinguir secretarias municipais voltadas para mulheres, negros, pessoas com deficiência, juventude e LGBT (as duas últimas, inexistentes).

Até sobre as próprias biografias já divulgadas se apartam do que é veraz. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) diz não ter convidado Russomanno para organizar o Sistema Nacional de Política e Defesa do Consumidor, como afirmava o candidato. Erundina não foi secretária da Educação de Campina Grande (PB), mas tão somente diretora.

Não há tanto assim a estranhar no comportamento de políticos que se movem bem no terreno pantanoso das imprecisões, da demagogia e da mais genuína mendacidade.

Parece ter aceitação consensual, no país, a ideia de que candidatos possuem licença para mentir, distorcer e enrolar, tanto quanto necessário para se eleger. Cabe aqui reiterar o truísmo: só os eleitores podem provar que se equivocam.

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