Folha de S. Paulo


José Serra e Marcelo Calero

Pampulha, patrimônio mundial

Apesar dos momentos delicados de instabilidade política e securitária pelos quais passou a Turquia, o Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco conseguiu concluir sua reunião em Istambul no último domingo (17). Na ocasião, tomou a decisão histórica de inscrever o Conjunto Moderno da Pampulha, em Belo Horizonte, na Lista do Patrimônio Mundial. Com a medida, o Brasil passa a ter 20 bens protegidos pela Unesco, 13 culturais e sete naturais, distribuídos por todo o país.

O conjunto foi idealizado no início dos anos 1940 por Juscelino Kubitschek, então prefeito da capital mineira. Projetadas por Oscar Niemeyer, as construções de estilo modernista em torno da lagoa da Pampulha tornaram-se referência e influenciaram toda a arquitetura brasileira, constituindo a primeira parceria de sucesso entre o arquiteto carioca e o político mineiro.

O entusiasmo e os desafios vivenciados na concepção da Pampulha serviram de laboratório para a construção de Brasília, anos depois.

Cartão postal de Belo Horizonte, o conjunto é formado pela Igreja de São Francisco de Assis, ou Igrejinha da Pampulha, o antigo cassino (atual Museu de Arte da Pampulha), a Casa do Baile (hoje Centro de Referência em Urbanismo, Arquitetura e Design) e o Iate Tênis Clube, importantes equipamentos de cultura e lazer para a população.

O projeto conta com jardins de Roberto Burle Marx, pinturas de Candido Portinari, azulejos de Paulo Werneck e esculturas de Alfredo Ceschiatti e José Pedrosa.
Segundo a Unesco, a síntese entre arquitetura, paisagismo e artes plásticas resultou em uma nova linguagem arquitetônica moderna, utilizada posteriormente para reivindicar identidades nacionais em toda a América Latina.

Por um lado, a inscrição da Pampulha na Lista do Patrimônio Mundial representa o reconhecimento internacional da genialidade de grandes nomes nacionais. Por outro, implica ao Estado brasileiro obrigação de conservar, promover e valorizar o local para as gerações atuais e futuras.

Parte dessa responsabilidade demandará uma ação cooperativa dos três níveis de governo para restaurar elementos do complexo, melhorar a qualidade da água da lagoa e garantir o pleno acesso comunitário e a ambiência cultural que dão vida a esse patrimônio genuinamente brasileiro.

Fruto de um esforço conjunto de vários anos, o sucesso da candidatura da Pampulha somente foi possível graças ao engajamento da sociedade civil e ao trabalho dedicado de servidores da Prefeitura de Belo Horizonte, do Governo de Minas Gerais, do Itamaraty -por meio do Departamento Cultural em Brasília e da Delegação do Brasil na Unesco, em Paris- e do Ministério da Cultura, por intermédio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que em breve completará 80 anos.

A tensão por que passou a delegação brasileira durante a reunião na Turquia foi mitigada pela atenção constante do Consulado Geral do Brasil em Istambul, que trabalhou em regime de plantão, 24 horas por dia, para atender os brasileiros na região durante todo o fim de semana.

A condução bem-sucedida dessa iniciativa e o processo dela decorrente servirão de exemplo para os nossos pleitos futuros, no trabalho permanente em prol do reconhecimento da diversidade cultural de que se orgulha a sociedade brasileira.

JOSÉ SERRA é ministro das Relações Exteriores. Foi senador (PSDB-SP), ministro da Saúde e do Planejamento e Orçamento (governo FHC), prefeito de São Paulo (2005-2006) e governador do Estado de São Paulo (2007-2010)

MARCELO CALERO é ministro da Cultura. Diplomata, foi secretário municipal de Cultura do Rio de Janeiro (governo Eduardo Paes)

PARTICIPAÇÃO

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