Folha de S. Paulo


editorial

Evolução sem fronteiras

Estudantes vinculados ao Ciência sem Fronteiras ou interessados em participar desse programa federal de intercâmbio estão apreensivos. Enquanto alguns enfrentam dificuldades para renovar bolsas de estudo no exterior, noticia-se que o governo de Michel Temer (PMDB) pode cortar benefícios concedidos.

Criado pela gestão Dilma Rousseff (PT), em 2011, o Ciência sem Fronteiras tinha a meta declarada de levar 101 mil alunos e pesquisadores brasileiros a instituições de excelência em todo o mundo.

Como acontece com tantas ideias bem-vindas, porém, a iniciativa sucumbiu ao populismo marqueteiro.

Empenhado em mandar a maior quantidade possível de estudantes para o exterior, o governo Dilma não privilegiou o encaminhamento para entidades melhores que as brasileiras. Reportagem desta Folha mostrou que menos de 4% dos bolsistas conseguiram vagas nas 25 melhores instituições do planeta.

Pior, muitos nem sequer dominavam o idioma em que teriam aulas -o que permitiu aos mais sarcásticos descrever o programa como um cursinho de inglês a preços extorsivos. Só em 2015, o Orçamento lhe reservou R$ 3,5 bilhões.

A despeito da maneira irresponsável com que foi conduzido, o Ciência sem Fronteiras é uma ideia valiosa demais para ser sacrificada, e as restrições impostas pela crise econômica oferecem a ocasião para que suas cláusulas sejam rediscutidas em termos adequados à realidade nacional.

Em artigo no jornal "Valor Econômico", Carlos Nobre (ex-presidente da Capes) e Concepta McManus (UnB), embora façam uma avaliação muito mais benigna dos resultados até aqui apresentados, sugerem uma série de medidas para aperfeiçoar o programa.

Destacam-se, entre elas, as seguintes propostas: criar limites a alunos de graduação, no intuito de aumentar a participação da pós-graduação; concentrar bolsistas em instituições de ponta; e exigir proficiência na língua em que os cursos serão ministrados.

É incrível que tais critérios não vigorem hoje. Talvez as pressões seletivas de um Estado em crise constituam o estímulo necessário para o Ciência sem Fronteiras evoluir para um programa mais robusto e mais eficiente.


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