Folha de S. Paulo


TIAGO ROSA DA SILVA

Projeto de lei dos aeronautas vai beneficiar a aviação no Brasil? Sim

A SEGURANÇA DE VOO NÃO PODE ESPERAR

Pilotos e comissários de voo têm a nobre missão de transportar diariamente milhares de vidas em segurança. O que pode acontecer se esses profissionais, responsáveis por operações tão complexas, ultrapassarem suas limitações como seres humanos?

Segundo dados da Oaci (Organização Internacional de Aviação Civil), 20% dos acidentes possuem entre suas causas a fadiga dos profissionais. Por incrível que pareça, não existe hoje no Brasil nenhuma regulamentação específica para controlar esse risco.

A legislação vigente, quando escrita, não levou em consideração fatores humanos, especialmente aquele que hoje é considerado uma das principais ferramentas na prevenção de acidentes aéreos: controle de fadiga.

Melhorar a segurança de voo para toda a sociedade é o objetivo principal da nova Lei do Aeronauta, que está em tramitação no Congresso Nacional. O projeto surgiu da urgente necessidade de se equiparar a defasada regulamentação brasileira às normas já adotadas nos principais mercados da aviação mundial, como Estados Unidos, União Europeia e Austrália.

Entre outros pontos, a nova lei flexibiliza –diminuindo ou aumentando em determinadas situações– as jornadas diárias de trabalho de pilotos e comissários. Esse tipo de mudança pode evitar, por exemplo, situações em que o sono torna-se incontrolável para os pilotos durante o voo, o que coloca em risco a segurança de todos.

A modernização da legislação, seguindo as recomendações da Oaci, inclui o gerenciamento de risco da fadiga por meio de escalas de trabalhos inteligentes. Ao contrário do que pregam os que são contrários à nova lei, isso pode melhorar muito a produtividade dos profissionais e, consequentemente, reduzir erros que levam a acidentes.

Um bom exemplo de como esse sistema pode ter impacto positivo na segurança de voo: o relatório final da investigação sobre o acidente que vitimou o governador Eduardo Campos apontou parâmetros compatíveis com cansaço e sonolência na análise de voz do copiloto.

O resultado final do projeto, contudo, vai além da questão da segurança. Irá propiciar melhores negociações das empresas aéreas com as seguradoras, além de uma redução expressiva nas dispensas médicas dos tripulantes.

Dessa forma, a nova lei trará ao Brasil as práticas mais modernas de segurança, ao mesmo tempo em que aumentará a competitividade das empresas por meio da diminuição dos custos. Ou seja, ganham as empresas, ganham os trabalhadores e, principalmente, ganha a sociedade.

O projeto inclui e regulamenta diferentes segmentos que atualmente ficam à margem da lei, como aviação agrícola, táxi-aéreo, instrutores de voo e serviços aéreos especializados, eliminando distorções e melhorando a vida dos profissionais da área e dos empresários envolvidos. Não à toa, o projeto está totalmente acordado entre trabalhadores e sindicatos patronais desses setores.

Depois de passar por dois turnos de votação em comissão no Senado e por mais duas comissões de mérito na Câmara dos Deputados, o PL 8.255/14 já foi debatido à exaustão por trabalhadores, sindicatos, empresas, entidades reguladoras e governo. Sofreu diversas mudanças e amadureceu, tendo hoje quase 100% de artigos acordados entre os interessados.

Resta ainda a Comissão de Constituição e Justiça, que vai analisar a constitucionalidade do texto antes de devolvê-lo ao Senado, que dará a provação final antes do envio à sanção presidencial.

O Sindicato Nacional dos Aeronautas não enxerga motivos para protelarmos esse passo. O quanto antes esse texto for sancionado, maiores são as chances de evitarmos novas tragédias na aviação brasileira. Estarão salvando vidas aqueles que ajudarem a tramitação célere do projeto.

TIAGO ROSA DA SILVA, 35, comandante de linha aérea, é diretor do Sindicato Nacional dos Aeronautas

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