Folha de S. Paulo


Saulo Nogueira e Mariana Barros

O PNE e o acesso a mercados estrangeiros

A desvalorização do real em aproximadamente 40% desde o início do ano tem chamado atenção da atividade de exportação. Apesar do aumento do custo de certos insumos, como gasolina e fertilizantes, o chamado "novo câmbio" tem contribuído para baratear os produtos brasileiros comercializados no exterior, oferecendo aos empresários um fôlego adicional na árdua corrida por competitividade.

O estímulo às exportações, no entanto, vai muito além de um câmbio desvalorizado. Exportação exige planejamento. A atividade não pode e não deve ser encarada pelo setor público e privado como um cano de escape para a crise econômica nacional.

Felizmente, esse entendimento finalmente abandonou o campo das ideias para ganhar forma, em junho deste ano, com o lançamento do Plano Nacional de Exportações (PNE) pelo governo federal. Por meio de seus pilares, diretrizes e metas, o PNE vem para suprir a falta de uma política pública que traçasse, de forma estratégica e coordenada, condições estruturais necessárias para que o Brasil possa melhorar suas exportações, tanto em termos de volume como de variedade dos produtos.

Nesse sentido, destaca-se o pilar de Acesso a Mercados. Ao lado das negociações comerciais e do fortalecimento aos investimentos no exterior, a identificação e superação de barreiras comerciais surge como uma novidade posta à pesa pelo PNE como mais uma forma de se buscar a abertura de novos mercados.

Se em termos de negociações comerciais o governo e o setor privado possuem vasta experiência, mesmo que nenhum grande acordo tenha sido efetivamente concluído pelo Mercosul, o Brasil ainda está engatinhando no enfrentamento sério e organizado às barreiras comerciais - principalmente aquelas de natureza não tarifária, como barreiras técnicas, sanitárias e fitossanitárias.

Como já é sabido pelos países desenvolvidos, experts em diplomacia comercial, o trabalho de mapear, acompanhar e analisar barreiras não tarifárias permite diagnosticar quais barreiras dificultam as exportações para os mercados de interesse, munindo, assim, o país exportador de um conhecimento que é fundamental ao questionamento preciso e à tentativa de remoção dessas barreiras. Além de questionar as barreiras restritivas, a diplomacia comercial compreende outras medidas para facilitar as exportações utilizando a inteligência comercial, parcerias e relações governamentais.

E é aí que justamente o empresário brasileiro precisa tomar a iniciativa para abrir - e, por que não, desbravar - novos mercados para as nossas exportações. Já que as negociações internacionais recém-iniciadas e/ou retomadas pelo governo ainda devem prolongar-se por mais alguns anos, o setor privado precisa atuar para poder criar e melhorar as oportunidades de exportação. O Brasil teve alguns poucos casos de sucesso de diplomacia comercial, como o caso do etanol nos EUA e do frango salgado na União Europeia. Agora, com as novas iniciativas do governo, os exportadores brasileiros podem avançar na abertura de mercados.

No âmbito da convergência regulatória, diversos Ministérios passaram a coletar informações sobre barreiras comerciais no intuito de tentar reduzir o custo de adaptação às normas estrangeiras, seja através de processos de harmonização ou de assinatura de acordos de reconhecimento mútuo. Não somente, o governo federal está criando um banco de dados sobre essas barreiras, o qual será a base para elaboração de ações, diálogos e negociações com outros países.

Já as entidades e associações setoriais, notadamente a CNI, Fiesp, Abit, entre outras, começaram a elaborar estudos visando identificar quais seriam as principais barreiras comerciais enfrentadas pelas exportações brasileiras e quais seriam as ferramentas mais úteis para enfrenta-las.

Trata-se de uma atividade complexa e demandante. Se muitos exportadores sequer conseguem identificar tais barreiras, muito menos tem conhecimento sobre como reduzi-las ou negocia-las. As entidades empresariais e o governo estão caminhando e a colaboração será essencial para gerar resultados.

A recente conclusão da Parceria Transpacífico (TPP) coloca certa pressão para o Mercosul assinar novos acordos comerciais. Cabe lembrar que o esforço de convergência regulatória e de remoção de barreiras estrangeiras pode ser conduzido em paralelo ou incorporado nas negociações comerciais brasileiras. Exemplo disso é a inclusão de uma diretriz sobre convergência regulatória no acordo em negociação Brasil-México, assim como o esforço da Coalizão Empresarial Brasileira (CEB) e do CBTC/Inmetro em identificar potenciais setores interessados em possíveis futuros acordos bilaterais com os mexicanos.

No entanto, ainda há certo ceticismo quanto à capacidade e à viabilidade de o governo conseguir avançar em negociações internacionais de comércio. Dado o atual contexto político-econômico, porém, é imperativo que o governo apresente propostas para revitalizar a economia brasileira. Alguns Ministros já começaram a sinalizar as intenções do governo de tomar essa direção.

Medidas que promovem e facilitam as exportações geram divisas e empregos - este fato está acima de qualquer posição partidária. E já é sabido por políticos e empresários que o Brasil está atrasado e não pode mais postergar a assinatura de acordos comerciais, sob pena de ficar ainda mais isolado no mundo. Portanto, essa é a hora de colocar em prática os programas do PNE. Só assim daremos chance efetiva para que a vez das exportações brasileiras possa chegar.

SAULO NOGUEIRA, mestre em diplomacia comercial e professor de relações econômicas internacionais, é sócio na Uno Trade
MARIANA BARROS, advogada, é consultora em defesa comercial e direito aduaneiro na Uno Trade

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