Folha de S. Paulo


ADOLFO SACHSIDA

Estados, municípios e o 13º salário

A crise fiscal é uma realidade. Jornais e analistas discorrem diariamente sobre o caos fiscal nas contas públicas brasileiras. Contudo, tal análise costuma ter seu foco na União. Poucos têm comentado sobre a situação fiscal de Estados e municípios.

O Rio Grande do Sul está com dificuldades de pagar seus funcionários, Minas Gerais já avisou que não pagará determinados bônus de desempenho, e o Distrito Federal já anunciou cortes de despesas e aumentos de impostos importantes. E os demais? Como será que andam as finanças dos pequenos municípios, ou o caixa de alguns Estados?

Existe um grande número de profissionais qualificados monitorando as contas da União. Boa parte dos desvios e incoerências são logo percebidos e denunciados. Contudo, isso não é verdade para outros entes federados. Ora, se a União com toda essa vigilância executou as famosas pedaladas fiscais, imagine o que Estados e municípios, muito menos vigiados, não fizeram.

Em 2014, vários governadores e prefeitos tentaram a reeleição. Para tanto, muitos deles aumentaram consideravelmente os gastos públicos e aplicaram aos seus balanços a mesma ética contábil adotada pela União.

Existe uma verdadeira caixa preta na contabilidade de Estados e municípios, muitos deles claramente insolventes a longo prazo. Desnecessário dizer que boa parte das cidades pequenas sobrevive apenas das transferências da União. Quedas nessas transferências são motivo de preocupação para eles. Com a arrecadação federal em queda, nuvens negras se formam no horizonte.

Dados do Tesouro Nacional indicam uma piora nos indicadores fiscais de vários Estados. Por exemplo, na relação entre despesa corrente líquida (DCL) e receita corrente líquida (RCL), um indicador de vulnerabilidade fiscal.

No Amapá, o índice saiu de 0,17 em abril de 2014 para 0,30 em abril de 2015 (uma piora de 73% em doze meses). Outros Estados seguiram o mesmo caminho. No Ceará, esse indicador piorou em 69% no mesmo período. São Paulo teve piora de 7,5%, Minas Gerais, de 7%, e Rio de Janeiro, de 14%, mostrando uma deterioração na situação fiscal medida por esse indicador.

Claro que, para Estados pequenos e com poucas alternativas de financiamento, esse problema é mais sério.

Para o município de São Paulo, com data base de abril de 2015, a despesa corrente líquida já é 81% superior à receita corrente líquida. Outros municípios paulistas também estão em situação delicada, como é o caso de Mauá com um DCL 15% maior que sua respectiva RCL, o que mostra bem o tamanho das dificuldades futuras.

Outro detalhe pouco comentado refere-se à bomba-relógio dos fundos de pensão municipais e estaduais. Qual deles é realmente solvente? Qual deles necessitará de vultosas transferências públicas para manter seus pagamentos em dia?

A hora da verdade se aproxima: em dezembro, vários Estados e municípios terão dificuldades para pagar o 13º salário a seus funcionários. O caos fiscal brasileiro é bem mais profundo e vai bem além da União: Estados, municípios, e várias empresas estatais também têm muitos ajustes a serem feitos.

ADOLFO SACHSIDA, 43, doutor em economia, é autor do livro "Fatores Determinantes da Riqueza de uma Nação" (ed. Interciência)

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