Folha de S. Paulo


editorial

Câmbio na China

Ao caldo de incertezas na economia global foi adicionado um novo e poderoso ingrediente. Nos últimos dias, o Banco do Povo da China (PBOC, o banco central) mudou sua política cambial e permitiu que a moeda do país, o yuan, se desvalorizasse 3% em relação ao dólar.

O movimento –o maior desde 1994– gerou inquietações mundo afora, pelo receio de que Pequim busque ganhar competitividade com o yuan mais fraco. Não por acaso, as Bolsas e as moedas de países ligados ao polo de comércio chinês, como Taiwan e Coreia do Sul, registraram forte queda.

Não é claro, contudo, que os chineses estejam declarando uma nova guerra cambial –ou seja, artificialmente depreciando sua moeda. O foco parece ser outro: antes totalmente controlada pelo PBOC, agora a cotação do yuan poderá flutuar com mais liberdade segundo as condições de mercado.

O atrelamento ao dólar, de fato, é hoje um problema para a China. Quando a moeda americana se valoriza, o yuan segue a alta, o que é prejudicial num momento de dificuldades como crescimento menor e excesso de dívidas.

Os riscos da mudança de regime cambial são grandes, porém. Se houver uma expectativa de desvalorização continuada do yuan, poder haver fuga de capitais para o exterior. Verdade que a China tem reservas de US$ 3,6 trilhões, em tese uma garantia de estabilidade, mas os depósitos internos nos bancos são muito maiores.

O processo em curso na China é acompanhado com atenção pelos demais países. Se o resultado da nova política for uma desvalorização mais forte do yuan (de 10% a 15%, por exemplo), os riscos de deflação global serão acentuados.

No caso de produtos industriais, setor em que a China é grande fornecedora, a maior competitividade obtida com a moeda mais fraca permitiria aos chineses reduzir preços em dólares para ganhar mercado.

A China, por outro lado, é grande importadora de matérias-primas, sobretudo industriais. O yuan mais fraco pode levar a um aumento dos preços domésticos, o que reduziria a demanda. Nesse caso, os fornecedores externos saem perdendo.

O Brasil está na segunda categoria. Minério de ferro e soja representam cerca de 80% das vendas para a China, nosso maior parceiro comercial. Mesmo que a queda de preços dos alimentos tenda a ser menos acentuada do que a dos metais, a dinâmica é negativa.

Ao fim e ao cabo, a mudança na China reforça a tendência de enfraquecimento do real e dificulta ainda mais uma saída da recessão com a ajuda do mercado externo.


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