Folha de S. Paulo


Pedro Eduardo Menegasso

Médico mais prédio novo é igual a saúde?

Assistimos, pela TV, nossos governantes inaugurarem periodicamente novos hospitais, unidades de pronto-atendimento e ambulatórios. O programa federal Mais Médicos atingiu cidades dificilmente alcançadas antes. Porém, eu me pergunto: o que estamos entregando à população é saúde?

A resposta a essa pergunta está em iniciativas simples como a proposta no projeto de lei nº 4.135/12, da senadora e farmacêutica Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), que foi aprovado pela Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados dia 1º de julho. Resta, agora, a apreciação da Comissão de Constituição e Justiça para o PL ser enviado à sanção presidencial.

O projeto propõe a obrigatoriedade do farmacêutico no Sistema Único de Saúde, uma luta antiga da categoria. Hoje, o número de farmacêuticos que atuam no setor público é insuficiente para atendimento da demanda e prestação de todos os serviços que cabem a esse profissional.

É claro que o farmacêutico não é a única solução para aperfeiçoar o SUS. Porém o PL está entre as poucas iniciativas governamentais que não se restringem a mais médicos e mais edifícios.

No SUS, o farmacêutico tem conhecimento para fazer uma gestão melhor dos medicamentos, poupando dinheiro público. Ele tem também como garantir a integridade desses produtos com o armazenamento adequado.

Ele deve também acompanhar o tratamento dos pacientes, com orientações importantes que são prestadas no momento da dispensação do medicamento. A isso, nós, da área, damos o nome de assistência farmacêutica.

Neste momento, o leitor estará se perguntando se um presidente de Conselho Regional de Farmácia (CRF), como eu, não estaria apenas defendendo o seu quinhão, a sua fatia de mercado de trabalho, ao brigar por isso.

O governo do Estado de São Paulo, por exemplo, entende a questão como corporativismo, e, por isso, mantém liminar na Justiça para garantir que não seja obrigado a contratar farmacêuticos.

Respondo que o questionamento é pertinente, sim. Uma entidade como o CRF-SP trabalha para garantir o exercício profissional da sua categoria, mas, em primeiro lugar, defende a saúde por meio do trabalho ético do farmacêutico, punindo, inclusive, os próprios inscritos que infringem a lei.

O CRF-SP defende a promoção da assistência farmacêutica e o uso racional de medicamentos.

Sugiro que o leitor passeie pelos dispensários dos postos de saúde e hospitais públicos. Armazenamento precário, geladeiras quebradas, desperdício, assistentes administrativos e outros servidores despreparados para lidar com esses produtos e pacientes confusos na fila de atendimento, indo embora cheios de caixas nas mãos e muitas dúvidas na cabeça.

Que aderência ao tratamento terá um paciente assim? Que eficácia terá esse tratamento?

Saúde não é apenas garantir um diagnóstico, muito menos distribuir medicamentos gratuitos em programas cheios de estratégias de marketing político.

Jogar diagnóstico e caixas de remédios nas mãos da população, assim, como se tivesse feito "a sua parte", abrindo mão da orientação e acompanhamento do tratamento, da educação sobre hábitos saudáveis, é desperdiçar recursos e negar aos brasileiros o que há de mais importante numa saúde pública de êxito: a promoção da qualidade de vida.

PEDRO EDUARDO MENEGASSO, 48, é presidente do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo - CRF-SP

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