Folha de S. Paulo


Marco Antonio Zago: A USP é tudo isso?

Pela quarta vez consecutiva, a Universidade de São Paulo foi reconhecida no ranking de reputação da organização britânica Times Higher Education –principal avaliação internacional de instituições de ensino superior– como uma das cem melhores universidades do mundo. Precisamente, a USP está entre as 60 primeiras.

Nessas classificações internacionais, concorremos com instituições que foram criadas há mais de 300 anos e que estão situadas em países com muito mais bagagem histórica em matéria de cultura e de geração de conhecimento.

Sem essa tradição é, no mínimo, bastante improvável que uma universidade alcance a excelência. Ninguém faz uma instituição desse porte e com esse nível de reputação da noite para o dia. Causa surpresa, portanto, que uma universidade localizada abaixo da linha do Equador, como é o caso da USP, alcance uma posição de tanto destaque.

Para que o leitor tenha uma ideia aproximada do que representa essa conquista, vale registrar que Itália, Espanha e Portugal possuem muito mais tradição em pesquisa, cultura e inovação e, não obstante, nenhum desses países tem uma representante na lista das cem melhores do mundo.

Não é só isso. Nenhuma universidade do mundo de cultura e língua latinas –abrangendo cerca de um bilhão de pessoas da Europa Ocidental, América Latina e Caribe– está em melhor posição que a USP. Há, porém, duas francesas na mesma posição (51ª a 60ª).

Somos a única universidade da América do Sul a registrar o nome no ranking da Times Higher Education por quatro anos seguidos.

É claro que isso alegra a todos. Uma instituição que tem 90 mil alunos, oferece 11 mil vagas no vestibular e forma 2.000 doutores a cada ano, situada a milhares de quilômetros dos grandes centros americanos e europeus, certamente precisa contar com muitas virtudes para chegar aonde chegou.

Mas, além do júbilo, que lição devemos tirar desse feito? Neste momento, devemos ter a maturidade de constatar que essa lição é a do trabalho, da autonomia universitária e do espírito público.

A USP se tornou o que é graças ao trabalho dedicado, qualificado e persistente de milhares de docentes, servidores e estudantes que procuram trilhar os caminhos do conhecimento em benefício da nossa gente e da humanidade.

O método com que trabalhamos não é menos determinante. Esse método ensina que o arrojo administrativo e a grandeza de propósitos não devem ser postos, jamais, como princípios opostos aos da transparência, da impessoalidade e da economicidade. A autonomia é indispensável ao desenvolvimento da ciência e à natureza diversa de uma universidade pujante e livre.

Ao mesmo tempo, a responsabilidade no trato dos recursos públicos, que são recursos de todos os cidadãos, deve ser um imperativo prioritário.

São valores como esses que nos trouxeram até aqui. Deles, não podemos nos desviar. A USP é um patrimônio de São Paulo, instalada atualmente na capital paulista e em outras sete regiões do Estado: Piracicaba, Ribeirão Preto, São Carlos, Bauru, Pirassununga, Lorena e Santos. Acima disso, ela é um patrimônio do Brasil e, cada vez mais, vem sendo valorizada pelo mundo acadêmico em todos os continentes, acima das fronteiras nacionais.

Buscando o melhor do ensino, da pesquisa e da extensão de suas atividades, a comunidade da USP tem todos os motivos para se sentir gratificada, mas deve estar consciente de que quer mais –e será mais.
Podemos nos orgulhar do que já alcançamos, sem fugir ao dever de saber que temos tudo para ser ainda melhores.

MARCO ANTONIO ZAGO, 68, é reitor da USP. Professor titular da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, foi pró-reitor de pesquisa e presidente do CNPq - Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico

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