Folha de S. Paulo


Ana Luisa da Riva e Celso Toledo: O potencial desperdiçado do uso público em parques

Diversos países protegem áreas extensas de seus territórios com o objetivo de manter a biodiversidade e elevar a qualidade de vida dos indivíduos –as áreas protegidas representam a fonte principal de água de um terço das 100 maiores cidades do planeta. O Brasil, por intermédio das Unidades de Conservação (UC), delimita área equivalente a três vezes o território da França.

Naturalmente, a simples demarcação dos espaços não é suficiente para assegurar efetividade às UC. No Brasil, estima-se déficit de 20% em relação ao dispêndio mínimo requerido para garantir que as UC funcionem adequadamente.

O incentivo a atividades econômicas ambientalmente sustentáveis na parcela dessas UC que, segundo seu plano de manejo, permitem o uso pelo público pode ser uma saída para a falta de recursos. A experiência de outros países sugere que oferecer oportunidades de visitação responsável pode ajudar a conservação e gerar benefícios relevantes para as populações. Além disso, permite que os indivíduos reconheçam o valor desses espaços e despertem o senso de pertencimento.

Em outros países, inclusive em economias menos potentes que a nossa, a participação do setor privado (empresarial e não empresarial) na gestão dessas áreas tem contribuído para essa geração de valor, transformando a conservação em uma fonte palpável de riqueza, emprego e oportunidade.

Estima-se, por exemplo, que para cada dólar gerado pelo turismo no Parque Nacional de Tongariro, na Nova Zelândia, 43 centavos circulam como receita adicional na economia do entorno.

É essencial, assim, ampliar o envolvimento da sociedade civil organizada e do setor privado na gestão desses espaços. O setor público deve ser o direcionador e o guardião das parcerias, mas não é o agente mais adequado para operar ou explorar economicamente as UC –faltam a ele recursos e traquejo. As parcerias surgem, portanto, como uma possível solução.

O caminho é trazer a eficiência de operadores motivados pela obtenção de lucros para maximizar a geração de receitas das atividades, cabendo ao governo desenhar mecanismos que alinhem os incentivos privados com os objetivos sociais e ambientais. Dessa forma, o lucro do parceiro privado pode ser a solução para o governo, se parte desse lucro ajudar a financiar a conservação.

Hoje, o Brasil não valoriza as parcerias com o setor privado para essas áreas e apesar da fragilidade atual das UC, o tema tem pouca importância nas políticas públicas.

O ambiente ruim para fazer negócios em geral e a situação precária da infraestrutura explicam, em parte, as dificuldades para ampliar o turismo nessas áreas. Ainda assim, uma análise preliminar das informações disponíveis sugere que a simples disseminação de práticas elementares adotadas pelas UC mais eficazes poderia gerar benefícios relevantes aos municípios envolvidos, da ordem de R$ 50 bilhões em dez anos.

Realizar este potencial é algo que não parece exigir grande esforço. Um passo inicial é a compilação de informações essenciais sobre a situação das UC, destacando-se a visitação e infraestrutura existente. Esses dados permitiriam obter uma estimativa mais precisa do potencial turístico renunciado pelas UC "esquecidas" e facilitaria o engajamento das autoridades locais na solução dos problemas.

O segundo passo, este mais difícil no Brasil, é tratar a iniciativa privada como parceira importante, reconhecendo que as parcerias podem ser a única forma de garantir a conservação efetiva dessas riquezas brasileiras.

ANA LUISA DA RIVA, diretora-executiva do Semeia, é medica veterinária com mestrado em ciências ambientais pela USP. Trabalhou por três anos no IFC-Banco Mundial, foi gerente geral do Ibama e diretora geral da Secretaria de Estado do Meio Ambiente em Alta Floresta
CELSO TOLEDO, diretor da E2/LCA, é doutor em economia pela USP, com especialização no departamento de MBA da Universidade do Texas. Foi editorialista da Folha, atuou na MB Associados e foi sócio-diretor da MCM

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