Folha de S. Paulo


Editorial: A língua condenada

Nada é mais essencial ao processo de aprendizado que a aquisição da linguagem –oral, na família, e escrita, na escola. Um sistema de ensino incapaz de levar toda a clientela ao nível mínimo de domínio da língua, desse ponto de vista, qualifica-se como um fiasco.

É o caso da educação fundamental pública no Brasil. Nas escolas estaduais e municipais, que concentram 85% das matrículas do 1º ao 9º ano, um em cada quatro alunos estaciona no patamar mais baixo de proficiência em português.

No 5º ano, ao cabo do ensino fundamental 1, um quarto das crianças na faixa dos 10 anos é incapaz, de acordo com a Prova Brasil de 2013, de cumprir tarefas simples de leitura, como identificar a figura central em uma fábula.

No 9º ano, já na casa dos 14 anos, 25% dos estudantes fracassaram em testes triviais, como localizar informações apresentadas de maneira explícita em textos literários.

Quando se tornarem adultos, esses rapazes e moças terão enorme dificuldade para usufruir de bens culturais e para encontrar bons empregos. Qualquer atividade não subalterna ou braçal, hoje em dia, exige que a pessoa seja capaz de entender as instruções de um manual, pelo menos.

Errará quem atribuir essa média sofrível apenas às deficiências das áreas mais pobres do país.

Sim, o Maranhão lidera esse ranking às avessas, com metade dos alunos de 5º ano no nível mais baixo de aprendizado do português e 38% dos estudantes de 9º ano nesse patamar. Mas São Paulo tampouco faz bonito.

O Estado mais rico da Federação tem cerca de um sexto dos quintanistas na condição de insuficiência, e também 23% dos mais velhos (muito perto da média nacional). Até Acre e Rondônia se saem melhor no ensino fundamental 2.

Pode-se argumentar que, há poucas décadas, boa parte –talvez a maioria– dessas crianças e jovens sequer estaria na escola, ou jamais chegaria a se alfabetizar.

É verdade. Pobre da nação, contudo, que se contentar com universalizar um ensino de má qualidade e formar gerações de iletrados ou analfabetos funcionais. O país todo tem de engajar-se na luta contra a condenação de sua juventude à pobreza intelectual.

Um currículo mínimo de português e matemática é o passo inicial para dar um norte aos professores e diretores e um recurso para que pais e pesquisadores possam monitorar o progresso de todos.


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