Folha de S. Paulo


Editorial: Sem linha no Equador

Aliados retóricos de Hugo Chávez, morto em 2013, os presidentes Rafael Correa (Equador), Evo Morales (Bolívia) e Daniel Ortega (Nicarágua) tiveram a prudência de não emular o desvario econômico da Venezuela. Não escaparam, entretanto, das tentações do messianismo e da perpetuação no poder.

O movimento mais recente se deu no Equador. Na Presidência desde 2007, Correa impulsionou uma nova Constituição no início de seu governo. Entre outras novidades, introduziu a possibilidade de reeleição, mas por apenas um mandato. Reconduzido em 2013, precisaria deixar o posto em 2017.

Agora, no entanto, ele acha que uma década é pouco. Propôs retirar da Carta de seu país o limite a mandatos consecutivos. No último dia 31, a Corte Constitucional autorizou que o projeto seja votado.

Na Bolívia, Morales escreve roteiro parecido. Disputou em outubro sua terceira eleição, graças a uma alteração promovida na Constituição no primeiro mandato. Após a vitória, não descartou novas mudanças a fim de permitir reeleições ilimitadas, embora por enquanto nada tenha feito nessa direção.

Na América Central, o Congresso nicaraguense modificou a Carta em janeiro para que Ortega se recandidate quantas vezes desejar.

Se os três países seguem os passos da Venezuela chavista na política, dela se afastam na economia. Em particular para a Bolívia e o Equador, que também dependem da exportação de hidrocarbonetos, a diferença foi decisiva.

Enquanto a Venezuela se afunda numa inflação de 63,4% e deve terminar 2014 em recessão, projeta-se para Bolívia e Equador um crescimento de, respectivamente, 5,7% e 4%, com preços sob controle e redução da pobreza.

No caso boliviano, o aumento no valor do gás vendido ao Brasil melhorou as receitas do Estado e tem compensado a queda recente do preço do petróleo. Além disso, após um início de governo marcado por estatizações, houve uma melhoria na segurança jurídica.

O Equador se vale de empréstimos da China para contrabalançar perdas com o petróleo e financiar o deficit nas contas públicas. Correa, pragmático, ainda promoveu a volta do país ao mercado de títulos.

Bem-sucedidos na área econômica, Rafael Correa e Evo Morales se aproveitam da popularidade para aprovar leis oportunistas, perseguir os meios de comunicação, silenciar a oposição e domesticar o Judiciário. Em lugar de fortalecer as instituições, optaram por enfraquecê-las, desperdiçando a oportunidade de deixar a seus países um legado positivo e duradouro.


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