Folha de S. Paulo


Daniel Damásio Borges e Ana Gabriela Braga: Quanto vale um professor?

A recente crise financeira das universidades estaduais paulistas recolocou em discussão os salários pagos ao magistério superior no Estado de São Paulo. Em reportagens sobre o tema, atribui-se com frequência essa crise financeira ao acréscimo dos gastos com pessoal.

Essa abordagem pode sugerir a ideia de que os salários pagos aos professores são muito elevados e que o seu congelamento seria a medida mais adequada para enfrentar tais dificuldades financeiras.

É preciso, antes de mais nada, dizer que os nossos salários estão, há anos, muito aquém dos valores recebidos por diversas categorias do funcionalismo público e dos trabalhadores da iniciativa privada com formação equivalente.

Os exemplos que ilustram essa afirmação são inúmeros: ao passo que diferentes categorias da área jurídica do funcionalismo público paulista conseguem obter salários iniciais superiores ou próximos a R$ 20 mil e sem que haja a exigência da conclusão de um doutorado, a remuneração de um professor doutor com dedicação exclusiva à universidade e em início de carreira é de R$ 9.184,94.

No setor de saúde, nos termos do recente plano de carreira do governo estadual paulista, um médico poderá receber um salário muito superior a um professor titular da Faculdade de Medicina com dedicação exclusiva à universidade.

Não se trata aqui, evidentemente, de desmerecer ou desvalorizar esse ou aquele profissional ou de achar excessivo esse ou aquele salário. Trata-se, isto sim, de realçar o valor de nosso trabalho, pois a formação de um professor doutor é longa e exigentíssima.

A obtenção de um diploma de doutor e o êxito em um concurso de ingresso à docência exigem anos de estudos, dedicação, disciplina e sacrifícios, assim como o exercício da carreira docente, cada vez mais regulada por metas de produtividade.

Dessa forma, parece-nos profundamente injusta a enorme distância entre os salários dos professores e dos outros profissionais.

É importante lembrar que outras categorias do funcionalismo estadual conseguiram um reajuste de seus salários em um único ano de até 96%. Ou seja, quando há vontade política e apoio da sociedade, o Orçamento do Estado mais rico da Federação pode ser organizado de modo a preservar setores fundamentais da administração pública.

Em verdade, a sociedade brasileira não dá à educação superior o valor e a prioridade que ela merece e a que ela faz jus.

Contrariamente ao que se afirma com muita frequência, há, sim, muitos membros do magistério paulista comprometidos com o ensino de qualidade, com relevantes atividades de extensão universitária e com a produção de pesquisa de ponta e de reconhecida relevância social.

No contexto atual em que a produção e a difusão do conhecimento tornaram-se ainda mais fundamentais para todos os aspectos da vida humana, é indispensável remunerar os professores à altura de sua longa e difícil formação, de sua dedicação e de sua importantíssima função social.

DANIEL DAMÁSIO BORGES, 35, doutor em direito pela Universidade Paris 1 - Panthéon-Sorbonne, é professor de direito internacional da Unesp
ANA GABRIELA MENDES BRAGA, 33, doutora em direito penal e criminologia pela USP, é professora da Unesp - campus de Franca

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