Folha de S. Paulo


Editorial: Pecados econômicos

O Comitê de Política Monetária reuniu-se nesta semana para fixar a taxa básica de juros da economia. Como ocorreu nos demais encontros da segunda metade do governo Dilma Rousseff (PT), o Banco Central tinha diante de si a indigesta combinação de inflação elevada com PIB em marcha lenta.

Desta vez, no entanto, não prevaleceu o incômodo com a escalada dos preços. Após nove altas consecutivas da taxa Selic –que passou de 7,25%, em março de 2013, a 11%, em abril deste ano-, o BC interrompeu a série de aumentos.

Ainda que o comunicado oficial sugira um questionável cenário de inflação sob controle, foi a piora da atividade econômica que mais pesou na resolução. Sobram, quanto a isso, razões para preocupação.
O PIB cresceu apenas 1,9% no primeiro trimestre, na comparação com o mesmo período de 2013. Em relação aos três meses imediatamente anteriores, o avanço foi de 0,2% –ou seja, nada. As projeções para o ano, hoje em torno de 1,6%, já começam a cair para 1%.

Praticamente todos os sinais da economia evidenciam a perda de vigor nos últimos meses. Em alguns casos, a queda abrupta remete a períodos de grave crise. Os índices de confiança do consumidor e da indústria, por exemplo, voltaram a níveis próximos dos momentos mais adversos de 2008-2009.

Ninguém pretende comprar, ninguém planeja produzir. Enquanto isso, são altos os estoques industriais, sobretudo no setor automobilístico; no comércio, as vendas cresceram 3% em 12 meses (até março), cerca de metade do ritmo observado nos dois anos anteriores. A renda disponível já não basta, e o crédito se encolhe num contexto de famílias endividadas.

Verdade que os dados do mercado de trabalho permitiriam certo otimismo; mesmo a baixíssima taxa de desemprego, contudo, se explica em parte pela pouca procura, e não pela criação de vagas -que, aliás, quase não se registra.

Quanto aos preços, de fato houve redução no caso dos alimentos e valorização do real (que diminui a pressão dos importados), mas a inflação de serviços ronda 8% ao ano, e as medições gerais de longo prazo mantêm-se próximas de 6%.

Seja como for, a decisão do Banco Central em relação à Selic decorre da percepção de que juros mais altos poderiam jogar a economia numa recessão. No momento, portanto, trata-se de decisão sensata.
Em perspectiva mais ampla, todavia, o BC tem falhado em sua missão. Seu pecado original, quando há três anos aceitou levar os juros ao menor patamar da história –em si desejável–, foi ter acreditado que o governo faria a sua parte, controlando os gastos públicos.

Que a taxa Selic esteja novamente em 11%, enquanto o PIB patina e a inflação assombra, é testemunho do fracasso da gestão econômica dos últimos anos.


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