Folha de S. Paulo


Morton Scheinberg: O mito da vitamina D

A vitamina D é agora a bola da vez nos consultórios médicos do Brasil, sendo considerado o elixir para toda e qualquer enfermidade.

De fato, vitamina D tem um papel muito importante no processo de absorção de cálcio no organismo, uma vez que o corpo é exposto à luz solar. O cálcio, por sua vez, é essencial para a saúde dos ossos. A grande maioria das pessoas só começa a apresentar deficiência de vitamina D a partir dos 65 anos.

Quando falta vitamina D no corpo, as concentrações de cálcio também caem, facilitando o aparecimento de doenças ósseas, como raquitismo e osteomalácia, além de facilitar a incidência de fraturas. A classe médica vem acompanhando mais de perto os índices de vitamina D, solicitando sua mensuração no sangue em exames de diagnóstico. Isso foi possível em grande parte devido ao avanço da tecnologia que hoje permite detectar melhor a vitamina D, passando a integrar o rol de exames dos check-ups.

Com o aumento do acompanhamento da vitamina D vem também a identificação de deficiência. Como, além de ser fundamental para os ossos, a vitamina D também é um fator benéfico para doenças cardiovasculares e autoimunes, principalmente esclerose múltipla, a suplementação passou a ser uma prática adotada com bastante frequência.

Recentemente, simpósios internacionais reavaliaram o conjunto de estudos com foco nos possíveis efeitos benéficos da suplementação de vitamina D em enfermidades que não sejam de origem óssea. O resultado mostrou que, embora em teoria a suplementação seja benéfica, na prática, os benefícios são bem marginais ou até inexistentes.

Quando a falta de exposição solar ocorre, seja por motivos culturais ou religiosos, a suplementação é de fato benéfica. Ou mesmo quando há problemas ósseos, que podem inclusive ser provocados pela falta de vitamina D. Ou até em casos em que o paciente faz uso de medicamentos que podem interferir nos índices de vitamina D, como cortisona ou anticonvulsivantes. É comum também o quadro de deficiência de vitamina D naqueles que passaram por cirurgia bariátrica.

O fundamental é suplementar essa vitamina quando houver quadros que podem justificar seu benefício, uma vez que o uso indiscriminado pode causar efeitos adversos sérios, podendo até levar ao quadro de intoxicação por vitamina D.

A avaliação da necessidade de suplementação deve ser feita de forma ponderada, avaliando-se todos os quadros diagnósticos e pesando os prós e contras.

Seria muito bom se a vitamina D fosse uma pílula mágica que pudesse resolver todos os males, mas a verdade está longe disso. Pelo que temos hoje na literatura médica, o melhor que se pode concluir é que os benefícios reais existem apenas em certos casos. Avaliar quando esses casos realmente existem é o que pode, fundamentalmente, transformar a suplementação de vitamina D nessa pílula em mágica.

MORTON SCHEINBERG, 69, doutor pela Universidade Boston e professor livre docente de imunologia da Universidade de São Paulo, é pesquisador em doenças do aparelho locomotor e clínico e reumatologista do Hospital Israelita Albert Einstein

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