Folha de S. Paulo


Liliana Ayalde: Juntos, Estados Unidos e Brasil podem mais

Não é segredo que cheguei ao Brasil como embaixadora dos Estados Unidos, em setembro de 2013, em um momento difícil da nossa relação bilateral. Mas estava e continuo determinada a superar essa fase, guiada pela percepção de que os nossos dois países têm muito mais a ganhar trabalhando juntos do que deixando escapar oportunidades.

Nos seis meses que se seguiram, minha experiência no Brasil, conversando com brasileiros de todos os cantos –de dentro e fora do governo, em Brasília, São Paulo, Rio, Salvador, Recife, Belo Horizonte, Porto Alegre, Fortaleza, Curitiba e outras cidades– apenas reforçou meu compromisso de enfatizar os pontos positivos e resolver as diferenças.

É isso o que parceiros fazem. A relação entre os Estados Unidos e o Brasil é resistente e vasta. Trata-se de uma amizade enraizada em histórias similares e identidades extraordinariamente análogas, mas distintas –com a mesma diversidade geográfica, étnica e cultural. Além de sermos os dois países mais populosos e as duas maiores economias do Ocidente, nossas semelhanças formam a base para uma parceria natural e multifacetada que parece inevitável em muitos aspectos.

As relações entre o Brasil e os Estados Unidos caminham em seu próprio ritmo acelerado, para além do alcance dos governos, que podem apenas ajudá-las ou dificultá-las, mas não interrompê-las. Considere as viagens entre os dois países. Os brasileiros estão visitando os Estados Unidos mais do que nunca –foram 2 milhões de pessoas, em 2013. Estamos fazendo o possível para facilitar esse trânsito. Amigo brasileiro, seja bem-vindo a Nova York, Miami e Orlando, mas considere também San Francisco, Chicago ou Austin. E não pare por aí.

Com esse objetivo, inauguramos o sétimo Centro de Atendimento ao Solicitante de Visto, em Porto Alegre, para que a obtenção de visto americano seja mais fácil. Os voos entre os Estados Unidos e o Brasil estão aumentando tanto na frequência –271 por semana–, quanto nas áreas que servem. Por exemplo, a American Airlines acaba de inaugurar voo de Porto Alegre para Miami, e a TAM agora voa de Belém para Miami. Vamos precisar de todos esses voos durante a Copa do Mundo, pois milhares de torcedores dos EUA –mais do que de qualquer outro país além do Brasil– compraram ingressos. Muitos deles, como o vice-presidente Joe Biden, visitarão o Brasil e torcerão pela seleção dos EUA em junho e julho. Mas tenho certeza de que se tornarão fãs do Brasil para a vida toda.

Ampliar as oportunidades de intercâmbio educacional entre os dois países é outra aspiração comum. A presidente Dilma Rousseff e o presidente Barack Obama demonstraram o mesmo compromisso ao firmar uma parceira inovadora em educação que atenderá às necessidades da força de trabalho do século 21.

Suas iniciativas –Ciência sem Fronteiras e 100 Mil Unidos nas Américas– ampliaram significativamente a maneira como as nossas instituições e redes de ensino superior se relacionam e aumentaram a mobilidade nos dois sentidos.

Uma das ferramentas mais importantes para isso é o ensino de inglês, uma habilidade que pode preparar melhor os jovens brasileiros para participar da economia global. Trabalhamos com diversos parceiros brasileiros para que essa ferramenta esteja disponível em todo o país.

Estive em Salvador para uma cerimônia de formatura de cerca de cem estudantes brasileiros que se graduaram em cursos de inglês patrocinados pela missão diplomática dos Estados Unidos no Brasil. A energia e o ânimo desses jovens foram fonte de inspiração para mim.

Ex-alunos desses programas com quem conversei conseguiram entrar em universidades brasileiras e norte-americanas. Também tenho tido a oportunidade de receber um número cada vez maior de estudantes norte-americanos que estão vindo ao Brasil, bem como de instituições americanas que almejam ampliar intercâmbios com a criação de cursos de português e estudos sobre o Brasil nos Estados Unidos.

O entusiasmo e o foco desses alunos me deixam confiante de que a futura base das relações Brasil e Estados Unidos será ampla e forte, construída a partir da experiência in loco intensiva e com a compreensão real do outro país, em toda a sua complexidade.

Minhas viagens pelo Brasil também me mostraram a força e a abrangência da nossa relação comercial. Os números falam por si sós. O comércio bilateral entre nossos países cresceu 169% na última década, chegando a US$ 72 bilhões no ano passado.

As oportunidades são enormes para ambos os países, e o potencial ainda não explorado é imenso. Empresas norte-americanas demonstraram seu compromisso com o mercado brasileiro ao investir na força de trabalho local, desenvolver tecnologias inovadoras em conjunto e interagir de maneira efetiva com o governo do Brasil em âmbito federal, estadual e municipal.

É longa a história das empresas norte-americanas como parte importante do desenvolvimento econômico e social no Brasil. Esperamos dar continuidade ao nosso trabalho com o governo brasileiro à medida que o país firmar parcerias com o nosso setor privado para promover a competitividade global das duas economias.

O setor agrícola brasileiro é de ponta e de nível internacional. Durante minha visita à Embrapa Cerrados, aprendi como os cientistas brasileiros desenvolveram uma tecnologia que revolucionou a agricultura e transformou o cerrado brasileiro em uma das áreas agrícolas mais produtivas do mundo. Além de elevar o Brasil à condição de um dos maiores exportadores de alimentos, os cientistas da Embrapa fizeram com que ele se tornasse um dos países que mais contribui para a segurança alimentar mundial.

As relações entre o Brasil e os Estados Unidos estão destinadas a serem multifacetadas e complexas, como de fato são. Estamos unidos por valores democráticos, uma visão de prosperidade inclusiva e a meta de alcançar os objetivos com trabalho árduo e perseverança na busca de oportunidades. A partir desses interesses comuns, esperamos construir uma parceria estratégica e duradoura com o Brasil.

Isso não implica concordância em todas as questões o tempo todo. Amigos podem tentar convencer seus amigos da legitimidade de suas opiniões, mas depois podem também discordar quando chega a hora da decisão –por exemplo, com relação à resposta apropriada à agressão à soberania e à integridade territorial da Ucrânia ou à abordagem mais produtiva para a longa crise na Venezuela.

Entretanto, quaisquer que sejam as discordâncias que possamos ter em questões específicas, grandes ou pequenas, elas não devem nos impedir de trabalhar em conjunto nas muitas áreas em que simplesmente faz sentido que assim seja. Como firmar parcerias em âmbito estadual e municipal ou trabalhar juntos em cooperação trilateral no Haiti, em Moçambique e em Honduras para ajudar a reduzir a pobreza.

Meus primeiros sete meses no Brasil convenceram-me de que a quantidade de coisas que podemos e devemos fazer juntos é grande e promissora. Estou certa de que os próximos meses mostrarão que esse ideal pode ser alcançado, enquanto percorro esta grande nação, fazendo amigos brasileiros e construindo novas pontes entre os nossos países.

LILIANA AYALDE é embaixadora dos Estados Unidos no Brasil

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