Folha de S. Paulo


Editorial: À espera de são Pedro

No plano oficial, razões eleitorais têm levado o governador Geraldo Alckmin (PSDB) a postergar ao máximo, talvez além do limite da responsabilidade técnica, a adoção de medida evidentemente impopular: o racionamento de água na Grande São Paulo.

Na prática, entretanto, inúmeros moradores da região já sofrem com cortes de água diários ou semanais. Seriam, segundo a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), decorrência de vazamentos, quedas de energia (que impedem o bombeamento) e ligações irregulares.

As falhas de abastecimento afetam municípios a oeste da capital –como Barueri, Cotia, Embu das Artes, Santana de Parnaíba e Itapecerica da Serra– e pelo menos oito bairros da maior cidade do país.

De acordo com habitantes desses locais, os problemas antecedem este verão de escassas chuvas. Em 2011, além disso, estudo já alertava para deficiências no fornecimento de água a esses bairros. Ao que tudo indica, nada foi feito para melhorar a situação.

Ainda pior, o descaso do governo paulista com os recursos hídricos não se limita a tais localidades. São conhecidas, pelo menos desde 2009, as fragilidades do Cantareira, responsável por abastecer 8,8 milhões de pessoas na região metropolitana de São Paulo. Relatório produzido pela Fundação de Apoio à USP chamava a atenção para o "deficit de grande magnitude" do sistema e recomendava medidas para evitar um colapso.

Os efeitos da estiagem evidenciam que os alertas foram ignorados. O reservatório tem hoje menos de 16% de sua capacidade total, o menor nível histórico. Somente uma improvável temporada de chuvas volumosas poderá afastar por completo o risco de racionamento –para nada dizer sobre prejuízos duradouros às represas.

Como se isso fosse tranquilizar a população, Geraldo Alckmin afirma que tem monitorado "dia a dia" a situação dos recursos hídricos. Pode ser o bastante para decidir-se sobre o racionamento, mas é pouco diante do que seu governo realmente deveria fazer: vislumbrar o horizonte de longo prazo.

Lidar com perdas de água na produção e no consumo é um imperativo. O atual desperdício na região metropolitana corresponde a 40% do sistema Cantareira.

Também é preciso se preparar para o futuro. Estudo encomendado pelo governo avalia que será preciso construir, até 2035, represas equivalentes a dois Cantareiras, com custo estimado entre R$ 4 bilhões e R$ 10 bilhões.

O prazo para tomar decisões nesse sentido é escasso; infelizmente, os recursos hídricos da região metropolitana de São Paulo também.


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