Um importante tema tomou conta dos debates em todo o mundo, nos últimos meses: a espionagem praticada pelos Estados Unidos.
Esse debate só é possível porque um homem corajoso sacrificou sua vida, suas amizades, sua liberdade e seu trabalho e abriu mão de seu próprio país. Esse homem é Edward Snowden, ex-agente de inteligência do governo dos Estados Unidos.
Eu, David Miranda, pude sentir na pele o quão perigoso é se envolver em relações entre países, em especial no tocante a abuso de poder.
Em agosto deste ano, fiquei detido por nove horas, sendo interrogado sem intervalos, arbitrariamente, no aeroporto de Londres, no Reino Unido. Hoje, o governo desse mesmo país acusa a mim e aos jornalistas que trabalham com histórias sobre terrorismo de sermos criminosos, por supostamente cooperarmos com essa prática.
O Brasil foi um dos países mais espionados pela agência de espionagem norte-americana, a NSA (Agência de Segurança Nacional). Devido às informações que Snowden tornou públicas ao repassá-las ao meu parceiro, o jornalista norte-americano Glenn Greenwald, conseguimos entender como a NSA espiona a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e seus ministros de Estado mais próximos.
Também pudemos conhecer os métodos de espionagem aplicados contra a Petrobras e contra a população brasileira, que tem por mês cerca de dois bilhões de e-mails e ligações rastreados pela agência.
Então, pelas razões aqui expostas, eu comecei uma campanha para que o meu país conceda asilo para Edward Snowden, acusado pela Justiça dos Estados Unidos por furto de propriedade do governo e por revelar informações secretas de defesa nacional e de inteligência. No solo de seu próprio país, ele poderia ficar até 30 anos preso.
As informações reveladas por meio de Snowden beneficiam o Brasil ao tornarem evidente a precariedade de nosso sistema de comunicação. Se hoje temos papel de destaque no debate internacional sobre a regulamentação da internet, isso se deve ao conhecimento que ele nos possibilitou adquirir.
No trabalho que venho fazendo com o meu parceiro, Glenn Greenwald, pude ver a reação do público brasileiro, calorosa e indignada com o tratamento dado a esse homem. Paradoxalmente, também tive contato com pessoas que dizem não se importar de serem espionadas, porque, argumentam, "não têm nada a esconder".
A questão é outra. Não se trata da coleta de dados feita pelo governo norte-americano e seus aliados. Trata-se de um comportamento ao qual ainda não sabemos como reagir, especialmente por causa da dúvida que paira sobre o papel da internet no cenário mundial. Será que a rede continuará sendo uma ferramenta de liberdade de expressão, comunicação e criatividade, ou será que ela se tornará um poderoso instrumento de governo para monitorar e controlar a população?
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, o Brasil e outros 47 países, liderados pelos Estados Unidos, assinaram a Declaração Universal de Diretos Humanos, com o intuito de resguardar os direitos mais fundamentais das pessoas.
Neste momento, venho pedir, como cidadão brasileiro, para que o meu país honre esse tratado e conceda asilo a Snowden. Se ele de fato for preso, nunca mais poderemos ouvir uma palavra dita por esse homem que tanto nos ajudou e pode nos ajudar ainda mais. Temos o dever de proteger os seus direitos.
Com este artigo, eu venho pedir a você, leitor, para se juntar a todos que procuramos trabalhar por um futuro no qual a privacidade e os direitos humanos sejam preservados.
DAVID MIRANDA, 28, estrategista de marketing, é coordenador da campanha para que o Brasil conceda asilo a Edward Snowden
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