Folha de S. Paulo


Irã diz que manifestantes 'pagarão o preço' por atos e restringe rede social

Após o domingo (31) começar com novos protestos, o governo do Irã alertou que os manifestantes "pagarão o preço" por violarem as leis do país e restringiu o acesso às redes sociais.

O presidente Hasan Rowhani disse, em reunião com seu gabinete, segunda a agência de notícias Mehr, que os iranianos têm o direito de protestar e de criticar o governo, mas que suas ações não podem levar à violência.

Em sua primeira fala nos quatro dias de protestos, Rowhani rebateu a declaração do presidente americano, Donald Trump, em apoio aos manifestantes: "aqueles que chamam os iranianos de terroristas não têm porquê simpatizar com nossa nação".

De acordo com vídeos transmitidos em redes sociais antes da restrição, milhares de pessoas marcharam em cidades do Irã nas primeiras horas do último dia do ano. A mídia oficial também começou a publicar vídeos de protestos, em que diz que são "contrarrevolucionários" aqueles que queimam bandeiras iranianas ou atacam edifícios públicos.

A onda de protestos foi iniciada na última quarta-feira em Mashhad, a segunda cidade mais populosa do país, e se espalhou por todo o Irã. Desde então, mais de 80 pessoas já foram detidas.

É a maior manifestação desde 2009, quando os iranianos protestaram por meses contra os resultados das eleições presidenciais.

Na capital, Teerã, a polícia disparou canhões de água contra os manifestantes na praça Ferdowsi. Alguns dos manifestantes gritam "Vida longa ao Xá Reza", quebrando um tabu no Irã.

Duas pessoas foram mortas a tiros em confrontos na cidade de Dorud no sábado (30) à noite, quando os manifestantes atacaram bancos e edifícios do governo e queimaram uma moto da polícia.

"Aqueles que destroem a propriedade pública, criam desordem e agem em ilegalidade devem responder por suas ações e pagar o preço, agiremos contra a violência e contra aqueles que provocam medo e terror", disse o ministro do Interior, Abdolreza Rahmani Fazli.

O vice-governador da província de Lorestan, Habibollah Khojastehpur, acusou "grupos hostis e serviços de inteligência estrangeiros de estar atrás desses distúrbios" ao explicar as mortes em Dorud.

Ele afirma que as forças de segurança não dispararam contra os manifestantes. "Nosso objetivo era acabar pacificamente com os protestos, mas, devido à presença de certos indivíduos e grupos, duas pessoas morreram", disse Khojastehpur.

De acordo com mensagens divulgadas via Telegram, os Guardiões da Revolução, o exército de elite iraniano, "infiltraram-se na manifestação e dispararam aleatoriamente contra a multidão e o prédio do governador" de Dorud.

Após a divulgação dessas mensagens e dos vídeos dos protestos, o governo ordenou a restrição ao Telegram e ao Instagram. As autoridades acusam grupos "contrarrevolucionários" estabelecidos fora do país de recorrer às redes sociais, especialmente o Telegram, para convocar a população a ir às ruas e a usar coquetéis molotov e armas de fogo.

Edward Snowden, o americano que vazou informações sigilosas da Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA, na sigla em inglês) em 2013, disse que o Telegram deveria estar trabalhando para que o serviço seja acessível mesmo com a restrição do governo.

"O Telegram vai enfrentar uma pressão crescente com o passar do tempo para colaborar com as demandas do governo iraniano por isso ou aquilo", ele escreveu no Twitter. "Não se pode evitar que um serviço independente e desestabilizador seja bloqueado em regimes autoritários, pode-se apenas postergar isso", ele acrescentou.

Os protestos dos últimos dias envolveram atos pró e contra o governo do presidente do Irã, Hasan Rowhani. Quem se opõe ao governo critica o desemprego, a escassez de recursos, o alto custo de vida e o governo "ditador". Já quem é pró Rowhani bradava contra os EUA e responsabiliza as sanções internacionais impostas ao Irã pelas mazelas enfrentadas pela população.

QUEM FALA

Até agora o aiatolá Ali Khamenei não se pronunciou sobre os protestos.

Já Shirin Ebadi, vencedora do Nobel da Paz, afirmou neste domingo, em entrevista ao jornal "La Repubblica", que as manifestações são apenas "o início de um grande movimento".

"Eu acho que as manifestações não vão acabar imediatamente, acho que estamos testemunhando o início de um grande movimento de protesto que pode ir muito além da onda verde de 2009. Eu não ficaria surpreso se isso se transformasse em algo maior", disse Ebadi, que vive no exílio em Londres.

Em 2009, os protestos contra a reeleição do ex-presidente Mahmoud Ahmadinejad foram violentamente reprimidos.


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