Folha de S. Paulo


Mianmar pode ser acusado de genocídio de rohingyas, diz ONU

O alto comissário de direitos humanos da ONU afirmou nesta terça-feira (5) que milhares de rohingyas continuam fugindo de Mianmar para Bangladesh enquanto os dois países negociam sua repatriação.

Segundo Zeid Ra'ad al-Hussein, não se pode descartar que esteja em curso um genocídio da minoria muçulmana por forças estatais.

Em sessão especial do Conselho de Direitos Humanos, ele disse que nenhum dos 626 mil rohingyas que fugiram de Mianmar para Bangladesh desde agosto passado deve ser repatriado a menos que haja um monitoramento robusto na região —o governo birmanês hoje não permite a presença de observadores estrangeiros.

Punições pelos assassinatos, agressões e estupros perpetrados pelos militares "parecem ser extremamente raros", afirmou Zeid.

Ele citou "relatos consistentes de atos de barbaridade espantosa cometidos contra os rohingyas, incluindo deliberadamente queimar pessoas até a morte dentro de suas casas e assassinar crianças e adultos; fuzilar indiscriminadamente civis em fuga; estuprar mulheres e meninas; e incendiar escolas, mercados e mesquitas".

"Alguém pode –alguém pode– duvidar que os elementos de um genocídio estejam presentes?", perguntou o alto comissário, em Genebra.

Antes, Zeid havia usado o termo "limpeza étnica" para se referir à violência praticada em Mianmar.

Genocídio é um crime cometido com o intuito de destruir o todo ou uma parte de um grupo nacional, étnico, racial ou religioso. Uma convenção da ONU exige que todos os países ajam para impedir um genocídio e para punir os responsáveis.

RETÓRICA XENOFÓBICA

Shahriar Alam, vice-chanceler de Bangladesh, disse na sessão que seu país está abrigando 1 milhão de "nacionais de Mianmar" após "execuções sumárias" e estupros praticados "como arma de perseguição". Bangladesh não considera formalmente os rohingyas refugiados.

De maioria budista, Mianmar nega cidadania ao grupo, que vê como estrangeiro.

Esses crimes são "perpetrados pelas forças de segurança de Mianmar e por extremistas budistas", afirmou Alam, pedindo o fim do que chamou de "retórica xenofóbica que chega aos altos escalões do governo e das forças militares".

Mais tarde, o conselho aprovou resolução condenando "a muito provável prática de crimes contra a humanidade" por militares.

Voz dissonante, o diplomata birmanês Htin Lynn disse que seu governo se "disassociava" do texto e denunciou o que chamou de "politização e parcialidade".

REPATRIAÇÃO

O alerta feito pela ONU ocorre em meio a uma discussão entre Bangladesh e Mianmar sobre a repatriação dos rohingyas que vivem em campos de refugiados improvisados nas proximidades de Dacca, capital bengalesa.

Estima-se haver mais de 1 milhão de cidadãos birmaneses nesses perímetros.

Mianmar informou estar finalizando os termos do acordo, visando a dar início ao processo de regresso dentro de dois meses.

Htin Lynn, embaixador do país na ONU, disse que o retorno dos "deslocados" —a quem não chamou de rohingyas– seria "voluntário, seguro, digno e sustentável". "Não haverá campos de refugiados", afirmou.


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