Folha de S. Paulo


Recorrência de ataques terroristas em Londres estimula paranoia

As imagens aéreas pareciam tiradas de um filme de ficção: em plena Black Friday, no último dia 24, um dos principais cruzamentos do comércio de rua de Londres estava vazio, cercado pela polícia.

Relatos de um tiroteio, possível ataque terrorista, geraram pânico e correria na região de Oxford Circus. Um mês antes, um acidente de trânsito em frente ao Museu de História Natural também gerou alertas de possível ataque. Nos dois casos, a preocupação acabou se revelando exagerada, e não houve confirmação de atentado.

Daniel Leal-Olivas - 24.nov.2017/AFP
Policiais fortemente armados cercam região da Oxford Circus, em Londres, após alarme falso de ataque
Policiais fortemente armados cercam região da Oxford Circus, em Londres, após alarme falso de ataque

Durante um ano em que o Reino Unido foi alvo de cinco grandes ataques terroristas, com ao menos 35 mortos, Londres vive um clima de preocupação e alerta que em alguns momentos parece beirar a paranoia.

Boatos de possíveis ataques agora têm potencial de gerar correria e medo, numa cidade que se orgulhava da frieza e da capacidade de continuar a vida normal apesar de ameaças. A segurança se tornou mais ostensiva em Londres, uma realidade completamente diferente da que havia na cidade até poucos anos antes.

A sensação de ansiedade agora é visível por todos os lados. Policiais armados com metralhadoras, uma cena rara até alguns meses atrás, podem ser vistos em estações de trem ou mesmo nas ruas.

Entradas de shows agora têm revista cuidadosa, e algumas casas de espetáculo, como o O2, em Greenwich, não permitem a entrada de mochilas. No Alexandra Palace, que recebe apresentações de bandas de rock, seguranças escolhiam pessoas do público para passar por revista mais detalhada.

Até mesmo no Winter Wonderland, a feira de Natal do Hyde Park que antes era completamente aberta, agora tem entradas controladas e revista de bolsas dos visitantes.

NOVA PAISAGEM

A preocupação também mudou a paisagem londrina. Barreiras de metal e concreto foram instaladas em pontes e entradas de parques e locais com aglomeração de público —uma tentativa de evitar ataques com veículos, como os registrados em Nice, Berlim e Barcelona.

Segundo o psiquiatra Neil Greenberg, entretanto, a ideia de que o Reino Unido vive um momento de "medo do terror" é exagero, e o alerta que está ligado pode ser saudável para evitar ataques.

"Os londrinos estão um pouco mais alertas e menos propensos a ignorar suspeitas do que teriam sido há um ano. Se isso é uma coisa boa ou ruim depende do seu ponto de vista", afirmou à Folha o psiquiatra.

Professor de saúde mental no King's College de Londres, Greenberg é especializado em temas ligados a trauma e segurança relacionados a questões militares e de defesa.

Para ele, é importante distinguir entre uma vigilância elevada, natural após os recentes incidentes como os registrados neste ano, e o que ele chama de "medo, hipersensibilidade ou ansiedade potencialmente patológicos".

Ele diz acreditar que Londres não está nesse nível preocupante. "As pessoas estão indo trabalhar, vão a shows e eventos esportivos, vão às compras", afirma.

A ressalva do pesquisador é um reconhecimento de que há uma diferença entre o alerta da população, que continua vivendo normalmente, e aquele do governo e dos sistemas de segurança do Reino Unido, agindo de forma preventiva para evitar novos ataques terroristas.

É o alerta oficial que se percebe na vigilância ostensiva e no esvaziamento de locais suspeitos de serem alvos de ataques. A população reage com medo a essas situações, mas no geral continua vivendo normalmente.

Segundo Greenberg, o melhor caminho para controlar a ansiedade é deixar o tempo passar sem que maiores incidentes voltem a acontecer. Ele ressalta, entretanto, que um certo grau de ansiedade, desde que não seja incapacitante, pode não ser uma coisa ruim.

"Os londrinos devem estar vigilantes, pois podem ajudar a prevenir futuros incidentes ou, pelo menos, limitar o impacto deles."


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