Folha de S. Paulo


ANÁLISE

Expurgo desafia imagem moderna de príncipe herdeiro saudita

O expurgo promovido durante o fim de semana na Arábia Saudita pelo príncipe herdeiro Muhammad bin Salman foi uma das mudanças políticas mais radicais no reino árabe desde sua criação, em 1932, por Ibn Saud.

O ambicioso herdeiro de 32 anos, conhecido pelas iniciais MBS, articulou a súbita detenção de 11 membros da casa real e de outros representantes da elite local, incluindo alguns dos mais ricos.

Fayez Nureldine/AFP
O príncipe herdeiro saudita Mohamed bin Salman, 32
O príncipe herdeiro saudita Muhammad bin Salman, 32, que se fortaleceu após expurgo

O poder na Arábia Saudita costumava ser pulverizado entre os diferentes ramos da família real, agradando às centenas de príncipes orbitando em torno do rei —o monarca atual é Salman, de 81 anos, pai de MBS. As forças de segurança, por exemplo, eram distribuídas entre os vários núcleos da família Al Saud.

Dividir as três forças —Exército, segurança interna e guarda nacional— era uma das estratégias para manter as ambições principescas sob controle e, com isso, evitar um golpe de Estado, como os que marcaram o Oriente Médio nos anos 1950 e 1960.

MBS, no entanto, colocou essas três forças de segurança sob sua esfera de influência com o expurgo do final de semana, justificado como medida de combate à corrupção.

Um dos príncipes detidos é Mutaib bin Abdullah, um dos filhos prediletos do rei Abdullah, morto em 2015. Mutaib chefiava a guarda nacional, responsável por proteger a família real saudita.

Outro braço da família que perdeu poder foi o do príncipe Alwaleed bin Talal, um dos investidores mais ricos da Arábia Saudita, também detido no fim de semana.

Bastidores das intrigas palacianas sugerem que ele tenha dado um dos votos negativos em um comitê real quando o rei Salman nomeou MBS como seu herdeiro.

EM BUSCA DE PODER

A própria nomeação de MBS, em junho passado, foi um sinal da concentração de poderes no ramo da família representado por Salman e MBS. O cargo de príncipe herdeiro era até então do príncipe Mohammed bin Nayef.

Analistas entendem que a extensão da ação de MBS tem como objetivo consolidar seu poder antes mesmo de ser rei. Ele já é visto como líder de facto da Arábia Saudita, governando na sombra de seu pai, e não deve tardar para se sentar sozinho no trono.

Mas a centralização, que também inclui a detenção de intelectuais e clérigos, se choca com a imagem que MBS tem projetado de si no exterior, a de um modernizador.

Ele é considerado, por exemplo, um dos responsáveis por reverter a polêmica proibição de que mulheres dirijam no país —algo que servia como um símbolo do radicalismo da vertente do islã seguida na Arábia Saudita, o wahabismo. Com as detenções, MBS pode começar a ser visto como mais um autocrata.

O expurgo também pode impactar, ao menos no curto prazo, seus planos de revitalizar a economia. Segundo relatos, empresários e membros da família real já retiraram alguns de seus ativos do país, temendo as reformas de MBS.

A crise atual fez, por outro lado, com que o preço do petróleo subisse a seu nível mais alto desde julho de 2015.

O barril de tipo brent, que custava no primeiro semestre de 2017 em torno de US$ 50, era negociado por US$ 62 nesta segunda-feira (6).

IRÃ

O chanceler saudita, Adel al-Jubeir, disse nesta segunda (6) em uma entrevista à rede CNN que vê como um "ato de guerra" do Irã o disparo de um míssil que sobrevoou a capital, Riad, no sábado (4).

O míssil foi disparado de um local no vizinho Iêmen, onde a minoria houthi luta contra o governo apoiado pelos sauditas em uma guerra civil desde 2015. Riad acusa o Irã de armar os rebeldes houthi, o que Teerã nega.

O chanceler iraniano, Muhammad Javad Zarif, respondeu afirmando que a Arábia Saudita culpa o Irã pelas consequências de suas próprias "guerras de agressão".


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