Folha de S. Paulo


'Situação na Venezuela só piora', diz pesquisadora de ONG

Pesquisadora sênior da Human Rights Watch, a venezuelana radicada na Argentina Tamara Taraciuk passou, a partir deste ano, a não ir mais ao país onde nasceu.

Responsável desde 2009 pela equipe que relata as violações de direitos humanos do chavismo, ela trabalhava de forma oculta na Venezuela e seu nome não aparecia nas publicações da ONG.

"Decidimos mudar a estratégia porque, com a deterioração da crise, poderia colocar em risco quem falava comigo", disse à Folha. "A gente também pensou que seria mais efetivo se eu pudesse falar sobre o que eu vi."

Ela afirma ser impossível negar que haja uma crise humanitária. E defende que os países latino-americanos —o Brasil entre eles— apliquem sanções contra o regime do ditador Nicolás Maduro.

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Folha - Qual é a situação para a pesquisa de violações de direitos humanos na Venezuela?
Tamara Taraciuk - Cheguei à Venezuela depois que meus chefes foram expulsos após apresentar um relatório em 2008 sobre a concentração de poder com [o ex-presidente Hugo] Chávez. Desde então a gente não pede permissão para fazer o trabalho.

Monitoramos a situação indo e vindo com bastante frequência à Venezuela, falando com vítimas, parentes e advogados, mas com muito cuidado para garantir a nossa segurança e das pessoas que falavam conosco. Mas, por incrível que pareça, agora algumas pessoas temem menos falar à distância, talvez porque quando a situação piora a gente perde um pouco do medo.

O que suas fontes afirmam sobre o desabastecimento e a escassez na Venezuela?
A situação no país é gravíssima e só vem piorando. Ninguém que tenha pisado em um hospital, conversado com um médico ou um cidadão venezuelano pode dizer com seriedade que não há uma crise humanitária.
Os que continuam negando a crise são só aqueles que veem a realidade por uma lente ideológica e as altas autoridades venezuelanas.

Como você vê a situação dos países latino-americanos, que têm sido um pouco reticentes em assumirem um discurso ou ações mais enérgicas com o governo de Maduro?
A região viveu, por muito tempo, um longo e vergonhoso silêncio, mas isso felizmente está mudando. O que a gente espera é que não sejam só palavras, e que a região e a União Europeia acompanhem as sanções já impostas pelos EUA e o Canadá.

Sanções que, por exemplo, cancelem vistos e congelem os ativos de funcionários envolvidos em violações de direitos humanos são uma mensagem direta de que não são bem-vindos e não têm muitos lugares para onde ir.

Com a diminuição dos protestos, as violações de direitos humanos de Maduro ficaram menos evidentes. Como vocês veem a crise após esse recuo?
Evidentemente é mais difícil convencer a opinião pública, mas a Venezuela permanece em crise, com repressão ao dissenso mesmo que não haja milhões de pessoas nas ruas. E o governo continua detendo pessoas, impondo medidas que fazem ser cada vez mais difícil criticá-lo.

Há uma possibilidade de enviar de forma unilateral a ajuda humanitária, por iniciativa dos países vizinhos?
Nada vai chegar em quantidade satisfatória sem a ajuda do governo venezuelano. O que os governos da região precisam continuar a fazer é oferecer essa ajuda, porque essa oferta vai colocar Nicolás Maduro em uma situação em que fica exposta sua negativa.


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