Folha de S. Paulo


Teor de novos arquivos sobre morte de Kennedy decepciona historiadores

Corbis
ORG XMIT: 10008441 *** USO FOLHA*** 24 Nov 1963, Dallas, Texas, USA --- A television news conference captures guards and secret service agents escorting Lee Harvey Oswald at the Dallas police headquarters two days after his arrest in conjunction with the assassination of President Kennedy. Oswald was shot by local night club owner Jack Ruby shortly after this photograph was taken. --- Image by © CORBIS ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Lee Harvey Oswald, que matou Kennedy, é escoltado por policiais e agentes do serviço secreto na sede da polícia de Dallas (Texas), dois dias depois de ser preso, em 1963

Historiadores americanos passaram as últimas 24 horas em claro tentando decifrar quase 3.000 documentos das investigações do assassinato do presidente John Kennedy que acabam de vir a público. Mas não viram nada ali que pudesse mesmo tirar o sono.

Dos papéis recém-divulgados, só 52 nunca tinham sido vistos —a maioria é quase ilegível e está fora de contexto, o que confunde mais do que ajuda a esclarecer dúvidas que pairam sobre um dos episódios mais traumáticos da história dos Estados Unidos.

"Devo dizer que minhas expectativas não eram muito grandes, mas a minha decepção é maior do que eu esperava", disse Gerald Posner, um dos maiores especialistas na morte de Kennedy. "A maioria dos dados é notícia velha reciclada como notícia nova. Não há nada de substância sobre o assassinato."

O presidente Donald Trump passou a semana atiçando seus seguidores no Twitter , prometendo grandes revelações sobre os acontecimentos de 22 de novembro de 1963, quando o jovem Kennedy , então com 46 anos, foi alvejado na cabeça durante uma carreata em Dallas pelos disparos de Lee Harvey Oswald, morrendo nos braços da primeira-dama, Jackie.

Mas Trump acabou retendo uma parte dos papéis seguindo orientações de agências de inteligência, o que gerou mais curiosidade sobre o que podem revelar os documentos mantidos em sigilo.

"Não esperava que isso fosse acontecer", diz Posner. "Mas isso mostra como o FBI e a CIA, que Trump gosta de chamar de Estado profundo, foram mais hábeis que ele no jogo que ele gosta de jogar. Ele poderia ter liberado tudo, mas se houvesse uma revelação perigosa, isso passaria a assombrar sua Presidência."

Entre os arquivos que dominaram as primeiras discussões, no entanto, está um memorando assinado por J. Edgar Hoover, então diretor do FBI, que se dizia preocupado que a morte de Lee Harvey Oswald, o assassino de Kennedy morto dois dias depois do atentado, fosse fazer brotar teorias da conspiração.

No documento, Hoover diz que era preciso "convencer o público de que Oswald é o assassino verdadeiro". Ele se preocupava, no caso, em provar que Oswald agiu sozinho, sem apoio da máfia, de cubanos ou soviéticos, mas o fato de ele ter morrido antes de ir a julgamento complicava ainda mais o trabalho do FBI.

"Sempre soubemos que Hoover queria encerrar o caso o mais rápido possível", diz Posner. "Ele precisava que Oswald fosse julgado e condenado, mas, com a morte dele, aumentou sua ansiedade. Ele tinha medo de ser punido por incompetência no caso."

Esses arquivos, de fato, mostram que o FBI demorou para entrar em ação para evitar o crime. Oswald havia sido preso três meses antes de matar Kennedy numa briga que estourou quando distribuía panfletos a favor de Fidel Castro em Nova Orleans.

Depois de solto, ele conseguiu sair do radar do FBI. Uma lista de pessoas que representavam uma ameaça ao presidente, aliás, só passou a contar com seu nome no próprio dia do assassinato.

Outra mensagem de Hoover, enviada três anos depois da morte de Kennedy, falava sobre a suspeita da KGB, a polícia secreta soviética, de que Lyndon Johnson, então vice-presidente, poderia ser o mandante do assassinato.

No material recém-divulgado, também não há quase nada sobre a viagem de Oswald à Cidade do México, onde visitou a embaixada cubana. Os detalhes de sua passagem pelo país, na visão de historiadores, poderiam esclarecer algumas dúvidas.

"Essa é a maior de todas as decepções", diz Posner. "Não há nada sobre esse episódio."

Max Holland, também estudioso da morte de Kennedy, concorda que se houver alguma revelação nesses documentos, ela terá alguma ligação com o México, mas descarta a possibilidade que algo possa mudar a versão dos fatos aceita desde o crime.

Outro historiador que vem se debruçando sobre os papéis, Larry Sabato, da Universidade da Virgínia, destacou, no entanto, documentos que provam que o país vizinho auxiliou os EUA nas investigações, tendo grampeado suas embaixadas da União Soviética e de Cuba e que Oswald teria dinheiro depositado num banco no México.

Sabato, que comparou a investigação dos documentos a montar um "quebra-cabeça de milhões de peças" lembrou ainda uma informação do serviço secreto britânico revelando que 20 minutos antes da morte de Kennedy um jornal em Cambridge, no Reino Unido, fora alertado que em breve haveria "grandes notícias" vindas da América.


Endereço da página:

Links no texto: